sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Feliz Natal

É corrente que na minha geração estejamos de costas voltadas para a Igreja e sejamos cépticos quanto às estórias relatadas na Bíblia. É difícil explicar aos meus amigos porque tenho um crucifixo em casa e um terço que anda sempre dentro da minha mala, porque a explicação de racional não tem nada e o pessoal é como S. Tomé.

O que queria dizer é que independentemente de tudo o que possa ser verdade ou lenda, existir uma crença de união que baseia a sua verdade na evidência do que o Homem tem de melhor é algo de maravilhoso. E ter transmitido os valores pelos quais o Homem deve reger o seu comportamento ao longo dos séculos, especialmente quando o analfabetismo era a normalidade foi um dos maiores contributos para o estabelecimento das sociedades em que hoje vivemos. Consolar as populações, prestar apoio social, fazer-nos acreditar que no matter what devemos agir sempre pelo Bem, ensinar o perdão é um dos maiores contributos para o progresso e estes são os motivos lógicos pelos quais assumo a lei cristã.

A fé faz o resto.
Um feliz Natal.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Modernamente antiquados

Em Portugal, a vida actual é feita de tudo menos de coisas brandas. Contudo, fico com a sensação de que os nossos professores de Direito, os nossos magistrados e os nossos legisladores ainda vivem com a ilusão de que leis brandas e castração do raio de acção das polícias farão com que os criminosos se recuperem para a sociedade.

Sabemos quase todos nós, todavia, que nada disso é assim. Relembro até que, há muitos anos, alertava o então Ministro Laborinho Lúcio (que fazia o favor de me aturar nos debates promovidos pelo PSD) para a necessidade de, sem cair no “olho por olho, dente por dente”, revermos as ideias ressocializadoras. Dizia-o não apenas por saber o que estudávamos na Faculdade (que a cadeia não recupera ninguém), mas também por sentir que conhecia a segunda parte da frase (a que políticos e académicos ocultavam): que não há possibilidade de, no mundo hodierno, encarregar a sociedade de reformatar sujeitos que entraram na via da prevaricação (a tal alternativa à cadeia).

De então até hoje, creio que as coisas pioraram imensamente! Multibancos rebentados com gás, assaltos a carrinhas de valores, assaltos a ourivesarias e outras lojas, furto de cobre das telecomunicações, agressões entre jovens filmadas para exibição pública, violações e outras malfeitorias multiplicam-se e com grau de violência e crueldade crescentes.

Amadoramente, creio que fui localizando algumas das causas … Desde logo, creio que caiu o que restava de um modelo de comportamento social fornecido pelos titulares de cargos públicos. Se o pós 25 de Abril trouxera o declínio da noção de dever (como correlato do direito) e a degradação da autoridade (não falo de autoritarismo, note-se!), os tempos mais recentes e alguns casos conhecidos propagaram-se na vox populi como razões para rejeitar o político como modelo.

Em segundo lugar, estou em crer que o crime se globalizou e que há redes que o tornam mais eficiente (mormente no escoamento dos produtos roubados ou furtados) e também mais avesso a contornos sociais portugueses (a tal brandura de costumes…), dados os compromissos transfronteiriços assumidos.

Depois, o próprio criminoso sendo também ele em número crescente proveniente de outros países trouxe atitudes mais violentas.

Em quarto lugar, as novas tecnologias – telemóveis e Internet – permitem “aprender” com o que se faz lá fora e banalizar a violência (algo em que o cinema e a televisão também ajudam).

Por fim e obviamente, a crise explica o acréscimo criminal que, todavia, não creio que diminua quando aquela se finar…

Este retrato pede leis exemplares e mais protecção e dignificação das forças policiais, que, ainda assim, se comportam magnificamente, sobretudo se comparadas a congéneres estrangeiras que tenho visto.

Resta-me terminar, desejando a todos um feliz Natal e um Ano Novo com (ainda) mais felicidade (e menos crise…).

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

de Leitura Obrigatória [sobretudo para os membros do Governo]

"(...)As reformas estruturais nunca passaram de um chavão. É preciso uma coragem sem limites para fazer a mudança de regime e criar uma sociedade nova em Portugal, mais livre e independente, mais sujeita ao risco mas com mais oportunidades.

Talvez falte espessura intelectual no Governo. Talvez dois dos pilares da troika (finanças públicas e sistema financeiro) estejam a ensombrar o terceiro (as reformas). Mas se tudo isto, esta consumição, esta hiper-tributação, esta vergonha de sermos pedintes, esta pobreza crescente for apenas para manter o que sempre existiu, na política, na economia, na sociedade, então será como prenunciou Lampedusa, é preciso que algo mude para tudo fique na mesma.

Passos Coelho ainda precisa de provar que consegue fazer o que quis prometer. Tem a última chance agora. Porque se tudo isto for para ficar na mesma, então o primeiro-ministro tem razão: o melhor é emigrar."

editorial da edição de hoje do Jornal de Negócios, por Pedro Santos Guerreiro, na íntegra AQUI

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

A nova Europa

A onda de choque financeiro que assolou a Europa em 2008 transformou-se num verdadeiro tsunami que ameaça varrer todo o sistema do Euro.. E ainda não vimos tudo!

De facto, os problemas actuais do Euro não são nada mais do que uma das numerosas variantes dos problemas de soberania. Porque, quando os dirigentes irresponsáveis cedem a soberania inteira ou parcial dum país – seja ela monetária, política, financeira, judiciária ou militar – seria melhor prestarem atenção ao que fazem e às implicações duma tal decisão, a médio e longo prazo.

Ceder a soberania nacional significa que alguém doutro, algures, tomará as decisões baseadas nos interesses doutras pessoas. Enquanto os interesses de todos coincidem, tudo está bem. Mas, desde que os interesses das diferentes partes divergem, segue-se imediatamente uma luta pelo poder. E as lutas pelo poder têm uma coisa em comum: o mais fraco perde.

Assistimos hoje a uma tremenda luta pelo poder na zona Euro. Quem vai ganhar? Quem vai impor novas políticas – a Alemanha ou a Grécia? a França ou Portugal? a Inglaterra ou a Espanha? a Alemanha ou a Itália?

Os grandes eixos deste novo tratado europeu baptizado “acordo intergovernamental”, em que a Europa dos 27, se transforma na Europa dos 17 da zona Euro, mais 9 outros países, são uma verdadeira declaração de guerra social contra os povos.

O acordo explica que é preciso sair da crise comprimindo exclusivamente e ainda mais os orçamentos públicos. Os povos vão pagar mas não os especuladores. Indo sempre no sentido da submissão aos mercados financeiros, este acordo prevê que as políticas orçamentais sejam supervisionadas pela instituição de justiça europeia, sendo as penalidades automáticas aplicadas por toda e qualquer ultrapassagem do limite fixado, actualmente de 3% do PIB.

As coisas são claras, a Europa não é nada mais que uma instituição ao serviço da finança e dos mercados. Os serviços públicos, os assalariados, e a população vão ser sujeitos à contribuição para salvar o sistema capitalista do naufrágio. A supressão de empregos privados, a não substituição dos funcionários que partem para a reforma, a extensão da precariedade e do desemprego, são os únicos horizontes que nos propõem os nossos governantes.

Eles querem fazer-nos crer que as dívidas soberanas são exclusivamente culpa dos povos, enquanto que os Estados salvam os bancos com milhares de milhões dos contribuintes e que estes mesmos bancos especulam em seguida sobre a dívida! Este tratado confirma a perda de soberania dos Estados ao nível orçamental e entregam-nos manietados de pés e mãos aos especuladores e aos fundos de pensões anglo saxões. Não existirá nenhum controlo democrático.

Se os Estados não são capazes de resistir à pressão da finança, a nossa liberdade acabou. Estamos à porta dum mundo totalitário inteiramente controlado pelos mercados.

Freitas Pereira

Ainda bem que sou da Académica…

Adoro futebol!... Porém, dito isto, confesso que há fenómenos que ao desporto rei dizem respeito que me vêm amargurando, pese embora se não tenha chegado ainda ao estado de putrefacção que atingiu a organização mundial do hóquei em patins (lembremos a “roubalheira” de que fomos alvo no último campeonato do mundo, na Argentina).

Se no plano internacional o Sr. Platini decidiu ser oposto de gravata do que era com o equipamento – a arrogância e os favoritismos que parece ostentar como Presidente da UEFA contrastam com a classe e o futebol perfumado que espalhou enquanto jogador – no futebol português as coisas vão de mal a pior.

Creio que podemos começar por dizer que falta-nos uma classe dirigente que tenha nas suas funções o decoro e a elevação necessários para corresponder ao talento dos nossos melhores jogadores. Em muitos casos – não “fulanizo” para não desviarmos a conversa do ponto que intento trazer à colação – são pessoas que esquecem a responsabilidade que têm, comportando-se como “bombeiros incendiários” que gritam “fogo!”, depois de ter ateado o incêndio das naturais paixões “tribais” com declarações irracionais, sem cavalheirismo e ridículas (veja-se o oposto no recente encontro de presidentes e de adeptos, antes do Real Madrid vs Barcelona...). Claro que para isto ajuda o facto de sermos um pequeno país em que há que vender três jornais desportivos diários (não conheço paralelo), mas tal jamais pode servir de desculpa para cidadãos que deveriam entender que a posição de liderança de massas que ocupam obriga a recato, ponderação e calma.

Evidentemente, as consequências no turbilhão de emoções que é a afeição a um clube é evidente; chegamos à idiotice de nos congratularmos com o facto de não ter havido danos no autocarro do Benfica, na última vez que se deslocou ao Porto (sublinho que diria o mesmo se fosse o Arroios). Esse resultado deveria ser a regra e não uma excepção a louvar! Acresce que, para que isso acontecesse, todos os contribuintes pagam milhares de euros em operações policiais, e é assim cada vez que há um jogo entre os chamados “grandes”. Com que direito?! Por causa de meia centena de energúmenos que deviam estar presos?!...

E aqui chegamos a outro ponto: as nossas leis são, em geral, brandas, mas no caso do desporto têm a dureza de uma massagem… Como é possível que não haja certos sujeitos que não passem os dias de jogo no posto de polícia?... Não é preciso mais; se tivéssemos dirigentes nacionais decentes, o incêndio provocado no Estádio da Luz (e todas as demais situações análogas pretéritas, presentes e futuras, com qualquer massa adepta) daria direito a uma interdição do estádio do clube apoiado por esses marginais , o que, por sua vez, obrigaria os associados e adeptos responsáveis (a larguíssima maioria) e os directores do clube a expulsarem quem não sabe respeitar os demais.

Falta o tempo para falar das consequências que atribuo à falta de portugueses nas equipas, ao falhanço nas Selecções jovens e à péssima arbitragem que temos, mas deixo um suspiro de contentamento, pois, no meio de tudo isto, os dirigentes e sua oposição, os adeptos singulares e a claque, e a própria instituição que apoio parecem-me muitos furos acima deste caos…

domingo, 11 de dezembro de 2011

Qualquer dia mudo-me

A única coisa que tenho a acrescentar a esta discussão dos passes sociais é que as poucas alturas em que gostava de ser de esquerda são quando vejo que para além de manifestações semanais elas trazem concertos. É uma animação.
Nós, na direita, temos direito a um concertozinho do José Cid e a umas bifanas à pala no último dia de campanha e pouco mais. 

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Nós, chineses europeus


Há alguns meses que vemos debater o futuro do Euro político a par do futuro do Euro económico. Para um país cuja abstenção nas eleições europeias ultrapassa os 60% este é um tema que pouco pode dizer aos seus concidadãos. Pode também, e fruto da contra-informação frequentemente gerada por uma esquerda eurocéptica, causar a confusão e a discórdia entre nós, leigos nestes assuntos, devido à falta de conhecimento das dimensões sociais do enquadramento europeu.
O processo de integração europeia, iniciado em 1948 por franceses e alemães teve um propósito político, o da não agressão entre dois Estados Soberanos preponderantes no centro do continente. Desenvolveu-se nas décadas seguintes na vertente económica com uma das mais antigas perspectivas de relacionamento entre os homens: é através do comércio que mais facilmente se pode evitar a guerra. De tratado em tratado, de entrada em entrada de novos membros no clube da Europa o intuito no Velho Continente passou numa primeira fase de aprofundamento de países com semelhanças civilizacionais evidentes, para numa segunda fase incluir os antigos satélites da URSS que aspiravam a índices de desenvolvimento económico e social semelhantes aos vividos no clube.
Este desenvolvimento natural implicou contingências burocráticas relativas aos processos de votação no parlamento e no conselho difíceis de gerir, tendo-se negligenciado a tarefa de transmitir continuamente aos cidadãos da Europa as implicações do aprofundamento de relações e transferência de competências dos parlamentos nacionais para as instâncias supra-nacionais. Por outro lado, o dos Estados, o enfoque nas uniformizações económicas e financeiras impostas em grande parte pelo Banco Central Europeu fez com que os novos actores políticos se esquecessem (ou parecem fazer esquecer) os propósitos desta União.
Havendo um peso relativo crescente da moeda única europeia face ao dólar nas reservas internacionais, e não se permitindo que o yuan entre na contabilidade internacional - julgo que por razões culturais - o Euro encontra-se numa forte penalização cujo propósito poderá ser o do enfraquecimento da União  devido à geo-estratégia económica dos grupos concorrentes mais fortes (neste caso Estados Unidos e China).
Sobre os Estados Unidos: a manutenção do dólar em baixa comparação com o Euro é uma legítima estratégia de escoamento dos seus produtos no plano internacional, a actuação das agências de notação financeira Moody's e Fitch não obedece a qualquer outro critério para além das mais-valias ansiadas pelos seus accionistas. A frase de Gordon Gekko "Greed is good" aplica-se-lhes na perfeição, sendo a comissão gerada pelos produtos derivados (warrants e cds) a maior motivação. Devo lembrar que são agências que atribuíam notação AAA+ em 2008 à AIG, que em 3 semanas esteve em risco de falir... Tendo as suas sedes organizacionais no continente americano, a difícil burocracia europeia pouco pode fazer.  Ali cada um desempenha o seu papel, portanto.
Sobre China  e a sua crescente importância na Europa: No início da década de 2000 vimos na Europa uma presença constante e crescente de produtos made in china produzidos com baixos custos humanos e tecnológicos e que competiram desonestamente com os seus concorrentes europeus que respeitam as básicas condições de trabalho das equipas producentes. Como sabemos, qualquer economia que pretenda entrar nos mercados secundário e terciário segue uma estratégia de implementação: começa a produção em série, defeituosa e a com uma relação custo/benefício que lhe permita assegurar um escoamento rápido e em grande escala para que posteriormente se possa aperfeiçoar  no mercado mais lucrativo. Na fundação da Mercedes em 1886 ninguém imaginaria que passados 125 anos seriam considerados os carros mais ambicionados no mundo. No sector nacional de calçado, após décadas em que a produção servia as classes B e C na Europa, e com a sua morte anunciada aquando a entrada de concorrentes no espaço Schengen, rapidamente os investidores nacionais redireccionaram o seu negócio apostando na qualidade e marca (Fly London, por exemplo). Pois o que respeita às relações económicas entre a Europa e a China, e sobretudo no que respeita à entrada de produtos chineses no continente, é esta a lógica que tem imperado. Com a diferença essencial de que num continente se respeitam as 8 horas diárias de trabalho, as compensações sociais, o gozo de férias pagas, a protecção à infância e os direitos consagrados na Carta Internacional dos Direitos Humanos. E são os segundos os que hoje se predispõem a comprar a dívida europeia. Naturalmente a troco de maiores concessões no campo económico. E talvez geo-estratégico.
São conquistas da civilização ocidental que, e a continuar no impasse criado pelos decisores europeus, seja por questões de agenda interna ou por entraves burocráticos em processos de decisão, estão comprometidas seriamente a médio prazo na nossa união e cuja responsabilidade é inteiramente nossa. Num mundo que se afirma pela concretização de planos multinacionais e de estabelecimento de blocos regionais (NAFTA, MERCOSUL, ASEAN, União Africana...) cujas prioridades assentam em benefícios aduaneiros e de livre transição de bens de consumo, a União Europeia é a mais eficiente experiência de inclusão da qual resulta o geral aumento das condições de vida dos cidadãos. É também o bloco cuja afirmação se deu em primeiro plano pela lógica kantiana de paz pela lei. E seria também o exemplo a seguir por todos os povos.
O que impede a União Europeia de criar as eurobonds, de baixar (ainda que artificialmente) a sua cotação face ao dólar, de criar critérios de entrada de produtos respeitantes à prática de dumping? O que impede a União de se afirmar no plano internacional como o bloco mais forte económica, social e culturalmente? O que nos impede a nós, portugueses, de afirmar que quer seja a Grécia, a Irlanda, a Itália (e agora os Franceses?) que tenham questões de dívida soberana é um problema relativo num bloco regional onde há a total legitimidade para se agilizarem processos e aprofundar com rapidez e eficácia os planos de harmonização fiscal, financeira e política tão necessários para a sobrevivência saudável do sonho europeu e afirmação internacional?

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Politicamente obrigatório

O filme, que até não é nada mau em si mesmo, torna-se obrigatório para todos os que, em compreensíveis momentos pragmáticos e cínicos de raciocínio sobre custos e benefícios, ponham em causa o mérito da deposição de Saddam Hussein. O filme baseia-se no depoimento de Latif Yahia, obrigado a ser duplo de Uday Hussein, filho do ditador, assassino e amante de carros e mulheres. À sua conta desapareceram pais de família e adolescentes (raparigas) de 14 anos.

Qualidade (espionagem e intriga)

A ver

Ilustra bem os riscos e os medos contemporâneos.

Parvo (com direito a alguns sorrisos)

Acção com qualidade suficiente, mas não mais...

Muito bom, sem explorar o lado mórbido da doença

domingo, 27 de novembro de 2011

Tragédia Lusa

(...) Em 37 anos não apareceu uma única obra decente de dramaturgia portuguesa. Apareceram romances em grande quantidade, apareceu poesia, apareceram livros de história ou memórias. Não apareceu uma única peça digna desse nome. Até o Teatro Nacional D.Maria II, na impossibilidade de se ficar eternamente no Frei Luís de Sousa, apresenta geralmente traduções. De resto, não lhe falta só dramaturgia portuguesa. Também lhe falta público. Uma noite no D.Maria é uma noite soturna. Francisco José Viegas cortou o orçamento (um milhão de euros) deste longo equívoco. Foi inteiramente justo. E, quando Diogo Infante resolveu recorrer à intimidação, não hesitou em o demitir. Chegou a altura de acabar com esta ridícula ilusão que em Portugal se chama "teatro".
Vasco Pulido Valente, no jornal Público, edição de 18 de Novembro de 2011


Custa acreditar no que acabo de ler, infelizmente com uns dias de atraso, mercê da qualidade de emigrante... Vasco Pulido Valente foi outrora Secretário de Estado da Cultura, mas nem parece. Na crónica em apreço, fala dessa arte milenar que é o Teatro com um desdém que arrepia. 

É certo que o Teatro tem sido, no cenário nacional, uma espécie de parente pobre da Cultura, dada a escassez de verbas, lucros e um número de espectadores naturalmente mais reduzido do que aquele que ruma a outras manifestações culturais. Porém, não faz sentido menosprezar e reduzir à insignificância as representações cénicas que ainda têm lugar em Portugal, com qualidade e um público meritório de consideração. Público esse que até tem aumentado - pelo menos no que toca ao Teatro Nacional -, e vem confirmar que aprecia e estima esta arte.

Acresce que não só temos bons actores, como temos boas companhias de Teatro e até excelentes festivais dedicados ao mundo cénico. Posto isto, até nos podia faltar dramaturgos (que não faltam...), mas motivos há de sobra para continuarmos a fazer Teatro. Mais: se as salas não enchem não é por não termos um Gil Vicente do séc. XXI, mas sim porque temos vindo a negligenciar o impacto que estas manifestações culturais têm na formação e desenvolvimento das novas gerações ao não lhes incutirmos hábitos de consumo cultural e ao não os sensibilizarmos para a importância deste género cultural.

Nos últimos anos foram muitas as peças de teatro que vi e apenas lamento o dinheiro gasto numa delas (lamentação essa que foi partilhada por aqui). Exceptuando esta, vi peças de qualidade nesse mesmo espaço, São Luiz, e ainda no D. Maria, no S. João, no Teatro da Trindade, no Teatro Aberto, no Maria Matos e em Cine-Teatros Municipais. Vi de tudo um pouco e, a propósito da frase de Pulido Valente na mesma crónica - “tirando antigamente a revista, e hoje o La Féria, não existe, nem nunca existiu um público de teatro em Portugal” -, confesso que nunca vi nada de La Feria. Nada tenho contra este género de representação teatral e reconheço valor às peças por ele levadas a palco, mas sou a prova de uma espectadora que vai ao teatro por gosto sem correr atrás das massas. Haverá mais gente como eu? Há, com certeza, que não tenho memória de ser a única na plateia.

Que me importa que sejam traduzidas, desde que bem traduzidas, adaptadas e representadas? Que me importa ver clássicos como o Rei Édipo ou outros textos de suma importância que não só me entretêm como têm sempre algo para ensinar?... O que realmente me importa - para terminar - é este preocupante caminho que as políticas culturais estão a trilhar e, mais grave, que haja cronistas de referência a aplaudir esta tragédia lusa... ...  

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

O EURO E A EUROPA

Minha esposa, que nasceu junto à fronteira alemã, expulsa com a família, pelos alemães, em 1940, para ceder o lugar à colonização alemã da Lorraine, diz-me desde há dezenas de anos: “Os Alemães nunca mudarão! Serão sempre os mesmos desde que detenham a força e o poder.” Isto é, desde que possam dominar os outros.

Trata-se agora do poder económico, porque o militar é impossível e ainda bem!

Isto vem a propósito das dificuldades nas negociações entre os dois chefes da Europa, Merkel e Sarkozy, na procura duma solução para salvar o Euro e a Europa.

O Banco Central Europeu, (BCE), desde sempre considerado como o filho legitimo da Bundesbank, está inteiramente dedicado à estabilidade monetária, custe o que custar, e não mudará de posição de um só jota! Foi o que Frau Merkel disse ao Sarkozy ontem.

Os Alemães dizem aos Europeus: os programas de recuperação ambiciosos são seguidos rapidamente de efeitos positivos sobre o crescimento” Economizem portanto e mais nada. Isto quer dizer: Ponham dinheiro de lado e as empresas investem. São estas as únicas condições para que a redução das despesas publicas possam ter, a longo prazo, efeitos largamente positivos” Tudo parece muito límpido!

Só que, o ciclo económico depende das rendas disponíveis e dos investimentos, que eles provenham do Estado ou do sector privado. Se toda a gente se põe a apertar o cinto ao mesmo tempo, a economia entra numa espiral recessionista.

Não sou economista, mas não vejo bem como nos podemos adaptar à nova situação do mundo! Como evoluir na economia real e ao mesmo tempo pagar as nossas dividas, tanto publicas que privadas? Criando novas dividas para pagar as dividas antigas? Os Alemães dizem-nos: SIM , primeiro devem pagar e economizai ao mesmo tempo, mesmo se para isso é necessário estrangular o povo.

Actualmente, todos os países ocidentais estão em crise ou para lá vão. Se todos os países equilibram os orçamentos ao mesmo tempo, todos se encontrarão na mesma situação: aumento das despesas causadas pelo desemprego, baixa das rendas e investimentos. A crise total, enfim.

E porque é que fazemos tudo isso. Não para proceder a reestruturações, mas porque pessoas como Merkel descobriram que o nosso endividamento era demasiado elevado e que devemos reduzi-lo. Ora, reduzir a divida duma tal maneira não nos leva a parte nenhuma: é a razão porque o investimento está no ponto morto.

Na realidade, as empresas só investem que se elas entrevêem benefícios potenciais ou se o Estado substitui os investidores durante a crise. Mas o Estado não deve investir, ele deve consolidar as finanças do país, assim lhe dizem as autoridades da UE.

O Banco da Inglaterra e o Banco Federal dos USA , têm , ao contrário, toda a liberdade para emprestar ao Estado e às empresas durante a crise e defender ao mesmo tempo a economia dos assaltos das agências de notação. A diferença é grande. Aqui está o processo de autodestruição que acabará por ganhar o conjunto da economia. Sem confiança, o sistema desmorona-se. Eis o que nos promete o futuro.

Freitas Pereira

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Jogar Damão

Percorridas várias partes de Goa, convido o Leitor para um passeio por Damão e Diu.

Comecemos pela primeira localidade. A ela se acede por comboio, desde a estação central de Bombaim (Mumbai, nos dias que correm) até Vapi, localidade na qual terá que arranjar um táxi que o leve ao longo dos, pelo menos, dez quilómetros que faltam para pôr os pés em mais uma antiga terra “desse grande país que é Portugal”.


Outra nota preparatória tem a ver com a hotelaria que é genericamente fraca, mas que não compromete, se a estadia não for prolongada.

Na parte de Nani Daman pontifica o forte de São Jerónimo


e, no seu interior, a Igreja de Nossa Senhora do Mar. O primeiro está aberto; a segunda, o que não é raro por lá, abre a pedido, mas sem maçada alguma (se deixar algumas rupias à portadora da chave, o seu conforto não diminui e o agradecimento é sincero).


Já na parte de Moti Daman (a parte grande, portanto)


as atracções são em maior quantidade. Comecemos pela mais desconhecida pela generalidade dos portugueses: por lá encontrará, devidamente assinalada, a casa onde viveu Bocage! Um senão: está degradada por dentro (janelas arrombadas e o que parecem ser restos de trabalhos de construção civil) e pouco conservada por fora. Espera-se um diálogo luso-indiano na área da cultura (eu já tentei alertar quem de direito…).



Ainda no interior da muralha da fortaleza (que li ter trinta quilómetros quadrados!) a Igreja do Bom Jesus


e a Igreja de Nossa Senhora do Rosário encantá-lo-ão pela riqueza da nossa presença na Índia. Se a primeira já prende, a segunda deslumbra, mercê da riqueza do trabalho de madeira esculpida que pode admirar no altar, no tecto e nas paredes.



Uma nota: a igreja está quase sempre fechada e não existe ao redor qualquer curador. Porém, se procurar pelo senhor Colaço, numa das casas do lado, poderá aumentar as suas possibilidades de ter sorte, se falar em português. Este cidadão, que por esta altura já estará reformado da administração local, faz gala em dizer que só abre a igreja (mandou alguém de mota buscar a chave a qualquer outro ponto da cidade) pelos portugueses (perguntar-lhe-á com emoção: “português de Portugal?”) e jamais por qualquer outra nacionalidade. Mais ainda: o nosso amigo Colaço faz questão de falar da saudade que tem dos tempos da presença portuguesa por comparação aos dias que correm… Entretanto, prepare-se para conhecer a família e a casa, para ter uma visita guiada às ruinas do Mosteiro Dominicano (séc. XVI)


e para ser “intimado” a um passeio à esplanada na praia de Jampore. Aí chegado, haja coração… Vendedores ambulantes, camelos, burros e asas deltas… Há de tudo como na farmácia…

Fora das muralhas de Moti Daman (para Sul), a Igreja de Nossa Senhora dos Remédios (1607)


 e o Mercado Municipal Carlos Fernandes (1942) são duas explosões de cor (a primeira no interior e a segunda pela mescla de produtos e de vestes que por ali se avistam).



Mais uma vez, uma família, uma casa, bebidas e aperitivos…

Deixámos Damão com saudade…

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Exercícios de aquecimento para uma crise maior


Vejo com apreensão e impotência o castelo de cartas europeu a desabar. Ontem, Portugal, Grécia e Irlanda. Hoje, Itália e Espanha. Amanhã, França?...

Depois, vejo troikas e burocratas impondo o fim daquilo que sempre nos distinguiu, como sejam o modelo social europeu e a cultura humanista (que já nem os grupos secretos parecem realmente defender).

De facto, o que, durante muitíssimos anos, nos distinguiu dos EUA e do restante mundo ocidentalizado (porque do resto nem há comparação possível) foi o primado da pessoa humana enquanto eixo em torno do qual se montou um Estado regulador que visava garantir-lhe a dignidade tida por mínima e regular os mecanismos do mercado, de modo a que se a marcha desenfreada não objectivasse o que deveria permanecer subjectivo (ou seja; que se não convertessem sujeitos em números, como, infelizmente, vemos em muitas eleições partidárias portuguesas).

Todavia, o que vemos hoje é a eficácia em lugar da realização pessoal, o lucro ou o ganho de projecto em vez do enriquecimento interior dos seres e do prestígio das instituições e a obediência acrítica em substituição da força criadora não domesticada.

E, no meio desta nova escravatura, surgem novos actores sem rosto e um outro demiurgo: o mercado e as suas lógicas. A prova dos poderes dessa divindade que deve aceitar dogmaticamente estão ínsitas não apenas nos ataques às economia de nações velhas de quase mil anos ou mais até, mas também nas escolhas que gente sem rosto fez para os governos da Grécia e de Itália. Ninguém questionará a seriedade de Papademos e de Monti. Contudo, não falamos de políticos no sentido clássico do termo (inventores), mas sim de peritos de finanças (mecânicos, portanto) que farão as delícias dos investidores e alegrarão os que pretendem converter os partidos em sociedades anónimas e em cadeias de produção, como se os indivíduos pudessem ser automatizados e as ideias fossem passíveis de serem enlatadas…

Mas por que diabo ganham estas forças tanto terreno? – perguntamos nós…

A resposta reside, a meu ver, numa classe política ocidental muito fraca e desprovida de horizontes e de coragem para saltos em direcção ao desconhecido. É como se destruíssemos os aviões e a capacidade de voar e apenas recorrêssemos a comboios e à sua marcha balizada por carris estreitos. Sarkozy nem com Bruni dá um De Gaulle e Merkel teria que renascer várias vezes para deixar a marca de Adenauer.

A consequência prática disto é que discutimos expulsões do Euro e várias velocidades, em lugar de termos ideais políticos para a Europa e de reinventarmos formas de singrar sem pôr em causa o “mais” social que sempre nos distinguiu.

No fundo, queremos tornar-nos em Estados Unidos da Europa sem possuirmos sequer a tradição ou os quadros mentais do liberalismo anglo-saxónico. Tem tudo para dar asneira…

Cá por Portugal, tirando os nomes consagrados e que vamos sindicando nos noticiários, reina a miséria de ideias políticas, a crueldade partidária e o bailado de interesses de toda a sorte. Cultura do mérito?! Só da boca para fora e com muita subserviência. 

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Madre Goa III

Continuando em Velha Goa – digna representante do barroco e do manuelino – e depois de termos falado da Igreja do Bom Jesus (onde descansa São Francisco Xavier), é de visitar a Sé Catedral. Acabada no século XVII, após oito décadas de construção, comanda o antigo Terreiro de Gales e teve no seu sino um dos sons mais temidos de Goa, já que marcava audivelmente o início dos autos de fé, ao tempo da Inquisição.


O seu interior é ricamente decorado e pontifica numa das capelas a Cruz dos Milagres – onde se diz ter aparecido o próprio Cristo, no século XVII, e à qual se atribuíram dotes milagrosos no domínio das curas (brincando com coisas sérias, apetece dizer: talvez sejam melhores que as prometidas pela Troika…) - e noutra o receptáculo que São Francisco Xavier usava para os baptismos.


No extremo oposto, pode visitar-se a Igreja de São Francisco de Assis (assim mesmo, nada de “Xavier”, desta vez). Retirada ao culto, é hoje um museu no qual vale a pena apreciar os frescos nas paredes e tecto e os elementos gravados na pedra alusivos à saga dos descobrimentos.


Entre ambos os templos, o Paço Arcebispal vale pelo edifício e pela arquitectura, tendo, aparentemente, sido recuperado – dado que não pude confirmar – pela Fundação Oriente (a ser assim, um forte aplauso).

Já ao lado da segunda igreja fica o Museu Arqueológico. Entre e regale-se com nacos da nossa História. Só para um breve destaque, lá “moram” a estátua de Camões (outrora em espaço aberto e público), esculturas variadas e os retratos dos vice-reis e governadores portugueses. Mais ainda: pode ver retratos dos Presidentes Carmona, Craveiro Lopes e Américo Tomás e, acredite ou não, um retrato do próprio Doutor Salazar.


Por fim, no que a este verdadeiro “complexo” histórico e religioso diz respeito, visite a Igreja de Santa Catarina da qual se diz ter sido o modelo para a Sé e, mais importante, ter sido erigida no local por onde Afonso de Albuquerque terá entrado na terra que fora de governo muçulmano.


A encerrar a visita a Velha Goa (partindo cedo, um dia é suficiente, desde que alugue carro ou contrate um táxi), suba ao Monte Santo e santifique-se visitando as ruínas do Mosteiro Agostiniano (no meio das ditas, verá azulejos e sepulturas em bom estado de conservação),


a Capela de Nossa Senhora do Rosário (manuelino em abundância e vistas maravilhosas),



a Capela de Santo António (que pudemos admirar graças a uma idosa senhora que, além de cuidar da Capela, a abre aos visitantes)


 e os Conventos de Santa Mónica e de São João de Deus (ambos fechados, à data).



Não desça do Monte, porém, sem uma visita ao excelente Museu de Arte Sacra, que apenas nos desgosta em dois pontos: não tem catálogo à venda e não permite fotografias…


Havendo fôlego e hidratação, um último “golpe de rins” levá-lo-á a maravilhosa Igreja de São Caetano



e ao Arco do Vice-Rei, parte da muralha original, onde pontifica uma estátua de Vasco da Gama.

Goa é, em suma, uma jornada de conhecimento e de emoção, que recomendo vivamente. A seu tempo, falaremos de Damão e Diu.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Tratamento de Choque

Li num jornal português que existe uma certa diferença de análise entre o PM e o PR sobre o tratamento de choque aplicado ao povo português. Uma renegociação da divida é necessária, antes que seja tarde.

O panorama social europeu é lamentável. Nada permite pensar que a situação dos povos europeus será melhor quando as dividas forem pagas aos bancos. E ainda com a condição que estas sejam realmente pagas. O que duvido. Não existe outra solução que de substituir o modelo económico europeu actual, concebido para criar dividas, voltar a uma política de estimulação da procura e do desenvolvimento, e a um proteccionismo dotado dum controlo drástico da finança.

Se os Estados não se impõem aos mercados, estes vão devorá-los, ao mesmo tempo que a democracia e todos os benefícios adquiridos pela civilização europeia.

A democracia nasceu em Atenas quando Solon anulou as dividas dos pobres aos ricos. Não se deve autorizar hoje os bancos a destruir a democracia europeia, a estorcer somas gigantescas que eles mesmos criaram na forma de dívidas.

Freitas Pereira

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

publicidade descarada, ou outra perspectiva sobre as jotas

Decorre amanhã e Domingo a II Academia Política promovida pela regional de Setúbal da JSD à qual tenho o orgulho de pertencer. É um evento preparado por jovens com gosto pela política, naturalmente ligados ao PSD, para outros jovens militantes e independentes.

Vamos estar na pousada da juventude de Almada reunidos durante dois dias em que são promovidas conferências, debates e simulações que visam, este ano, dar aos participantes uma perspectiva mais clara do funcionamento dos executivos e assembleias municipais do nosso país e assim incentivar a participação cívica de todos os que consideram que o seu papel na sociedade tem mais importância do que o depósito do voto a cada 4 anos. Serão abordados temas prementes na nossa sociedade, tais como os investimentos públicos, a reforma da administração local, o desemprego ou a necessidade de contratação de polícias municipais e partilhadas algumas perspectivas sobre os vectores de desenvolvimento da região.

O painel de oradores está já completo, e composto por Carlos Coelho, Luís Rodrigues, Miguel Salvado, Nuno Matias (mentor da I Academia Política) e Bruno Vitorino.

Recebemos este ano também Macário Correia, que nos trará a sua experiência na autarquia de Faro e Alexandre Picoto que abordará a preparação de campanhas autárquicas e divulgação da mensagem política.

E para quem no alto da sua sapiência arrota postas sobre as jotinhas, fica feito o convite a participar no jantar de Sábado com o Paulo Colaço, que virá partilhar a história da JSD, ou na sessão de encerramento dos trabalhos que contará com a presença de Duarte Marques, actual líder da estrutura e de Maria Luís Albuquerque, secretária de estado do tesouro.
Claro que aprendemos a cacicar e a agitar bandeiras, mas sabemos fazer bem mais do que isso ; )

Nota: A LODO SAD está maravilhosamente representada nesta iniciativa pela Rita Matos Oliveira


Madre Goa II

Continuamos a percorrer a capital de Goa, Panjim.

Completada a volta sugerida na semana passada, não é de desprezar uma visita ao Museu Arqueológico, que fica um pouco arredado do centro,

mas ainda a distância que pode fazer-se a pé, mormente se atestar as reservas de água, antes… As peças de interesse são várias: medalhões em pedra com a efígie, entre outros, de Afonso de Albuquerque, D. João de Castro e Luís Vaz de Camões,



notas e moedas representativas da administração portuguesa,


carimbos oficiais,

estatuária e pintura de relevo, um estandarte do século XVII evocativo de uma batalha ganha aos holandeses, máquinas de extracção da lotaria


e, la crème de la crème, uma mesa pertencente à Inquisição de Goa, demonstrando que, de vez em quando, não éramos “gajos assim tão porreiros” para a rapaziada local…



Talvez para devolver parte da cortesia, o Museu inclui ainda uma sala sobre a tareia com que nos brindaram no alvor da década de 60 (entre outras ilustrações, conta-se a do General Vassalo e Silva, último Governador, na sua condição de prisioneiro).


Para terminar o dia na antiga Nova Goa (passo o paradoxo denominativo), contorne o edifício da Polícia do Estado da Índia (hoje quartel da Polícia indiana) e entre no Instituto Menezes de Bragança (uma biblioteca) para admirar, no átrio, azulejaria portuguesa ilustrando os Lusíadas.

Posto isto e sendo que o Estado de Goa está repleto de tantas outras jóias que não pudemos visitar, reserve um dia inteiro para Velha Goa que, hoje em dia, é uma terra museu, já que ninguém por lá mora, não havendo restaurantes ou cafés abertos; quando muito compra-se uma ou outra bebida e “viva o velho”!... Diga-se, aliás, que só o esplendor das suas Igrejas nos faz crer que esta foi uma das maiores metrópoles asiáticas e uma cidade que olhava de alto para a pequena Lisboa, no início do século XVI.

Seja como for, o apogeu existiu na cidade que viu chegar Afonso de Albuquerque, por volta de 1510, e São Francisco Xavier, trinta e dois anos mais tarde, mas que, contudo, parece ter vivido numa relação tumultuosa com a santidade, tais as centenas de casos de sífilis registadas pelo hospital local. O laxismo que consta de registos históricos vários decidiu casar-se com a contaminação da água potável pelos esgotos, com os mosquitos (devidamente armados com malária) e com razões militares e comerciais para pôr a população de casa às costas e a caminho de Nova Goa (Panjim).

Velha Goa, património chancelado pela UNESCO e exemplo conservado do esplendor barroco e manuelino, é, por tudo isto, um enorme museu, no qual não deve perder a esplendorosa Igreja do Bom Jesus, à qual rumam fiéis e turistas para ver o caixão de prata e vidro que contém os restos mortais daquele Santo. A fachada, o altar mor e a sacristia são outros pontos altos de uma pérola que constitui um belo rosário da presença portuguesa em conjunto com outras de que vos falarei brevemente.