quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Modernamente antiquados

Em Portugal, a vida actual é feita de tudo menos de coisas brandas. Contudo, fico com a sensação de que os nossos professores de Direito, os nossos magistrados e os nossos legisladores ainda vivem com a ilusão de que leis brandas e castração do raio de acção das polícias farão com que os criminosos se recuperem para a sociedade.

Sabemos quase todos nós, todavia, que nada disso é assim. Relembro até que, há muitos anos, alertava o então Ministro Laborinho Lúcio (que fazia o favor de me aturar nos debates promovidos pelo PSD) para a necessidade de, sem cair no “olho por olho, dente por dente”, revermos as ideias ressocializadoras. Dizia-o não apenas por saber o que estudávamos na Faculdade (que a cadeia não recupera ninguém), mas também por sentir que conhecia a segunda parte da frase (a que políticos e académicos ocultavam): que não há possibilidade de, no mundo hodierno, encarregar a sociedade de reformatar sujeitos que entraram na via da prevaricação (a tal alternativa à cadeia).

De então até hoje, creio que as coisas pioraram imensamente! Multibancos rebentados com gás, assaltos a carrinhas de valores, assaltos a ourivesarias e outras lojas, furto de cobre das telecomunicações, agressões entre jovens filmadas para exibição pública, violações e outras malfeitorias multiplicam-se e com grau de violência e crueldade crescentes.

Amadoramente, creio que fui localizando algumas das causas … Desde logo, creio que caiu o que restava de um modelo de comportamento social fornecido pelos titulares de cargos públicos. Se o pós 25 de Abril trouxera o declínio da noção de dever (como correlato do direito) e a degradação da autoridade (não falo de autoritarismo, note-se!), os tempos mais recentes e alguns casos conhecidos propagaram-se na vox populi como razões para rejeitar o político como modelo.

Em segundo lugar, estou em crer que o crime se globalizou e que há redes que o tornam mais eficiente (mormente no escoamento dos produtos roubados ou furtados) e também mais avesso a contornos sociais portugueses (a tal brandura de costumes…), dados os compromissos transfronteiriços assumidos.

Depois, o próprio criminoso sendo também ele em número crescente proveniente de outros países trouxe atitudes mais violentas.

Em quarto lugar, as novas tecnologias – telemóveis e Internet – permitem “aprender” com o que se faz lá fora e banalizar a violência (algo em que o cinema e a televisão também ajudam).

Por fim e obviamente, a crise explica o acréscimo criminal que, todavia, não creio que diminua quando aquela se finar…

Este retrato pede leis exemplares e mais protecção e dignificação das forças policiais, que, ainda assim, se comportam magnificamente, sobretudo se comparadas a congéneres estrangeiras que tenho visto.

Resta-me terminar, desejando a todos um feliz Natal e um Ano Novo com (ainda) mais felicidade (e menos crise…).

2 comentários:

ADEK disse...

Gostei da reflexão. E preocupa-me o futuro neste tema. Muito. Mas como estamos na época em que as coisas boas sufocam as más por alguns dias, deixo os meus votos de Boas Festas!

Defreitas disse...

Todo sistema jurídico é relativo a uma sociedade. A justiça não pode ou não deve conceber-se como principio universal, porque será sempre ligada aos costumes das sociedades.

Precisamente, é porque a vida colectiva encontra dificuldades na articulação dos interesses individuais, que o direito é necessário.

Porque ele supõe a existência de regras comuns ou de leis ( mais ou menos explicitas) , o direito implica uma reciprocidade completa entre os sujeitos.

Mas sejamos honestos, à sombra das leis da Republica, uma parte da população portuguesa encontra só o desprezo. O desprezo de um universalísmo proclamado mas cego às diferenças. Este desprezo que conduz à discriminação.

E, à sombra das leis de Republica, a maioria das pessoas que vivem nesses bairros populares mais duramente atingidos pelo desemprego de massa, a desigualdade escolar, a insegurança social, a relegação económica e a marginalizaçao territorial. pede mais justiça e não mais repressão.

Estes homens e mulheres sequiosos de justiça e de igualdade fazem a dolorosa experiência do medo e do ódio e sabem que a justiça demasiado tardia é, de facto, : negação de justiça.

A miséria e o desemprego nos quais é precipitada uma grande parte da população, enquanto que a minoria maviosa participando ao poder se enriquece impunemente, a corrupção e o despotismo erigidos como norma do funcionamento do Estado, levam à revolta , que apelará automaticamente à repressão. Como aplicar a justiça elementar quando os "grandes" não respeitam a lei ?
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Fecham-se as fábricas ou deslocalisam-se e no lugar construem-se prisões. Como não reagir contra este futuro carceral que se prepara?

Quem não vê que as prisões como única esperança para os nossos filhos não é aceitável?

Claro que existe uma outra porta de saída : a emigração! Mas que desastre para a Nação quando os sus filhos, quiçá os mais bem preparados para o futuro são obrigados a abandonar a Pátria! Aqueles que restam procuram então outros meios para viver, quando o trabalho não existe.

Numa tal óptica, a justiça redefinida como equidade implica o direito à liberdade fundamental : os estatutos económicos e sociais. Para evitar a necessidade repressiva.


Freitas Pereira
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BOM NATAL PARA A FAMILIA DO LODO OS SEUS LEITORES