quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Valores decotados - Parte I


Há umas semanas, vejo no noticiário da RTP e, subsequentemente, leio na imprensa que o Agrupamento de Escolas de Valadares proibiu, através do seu regulamento interno, o uso de “decotes ‘excessivos’, calças ‘excessivamente descidas’ ou ‘saias demasiado curtas’" (cito, na circunstância, o “Sol”).
Começando pela abordagem política, relembra o semanário citado que, em 2009 e por ocasião de evento similar em Pinhal Novo, o Bloco de Esquerda terá declarado tratar-se de "inusitado atentado à liberdade individual, expressando "o mais profundo repúdio" pelo seu "cujo cariz autoritário" (idem). Ora bem, o mesmo partido que quer proibir “piropos” rejeitava aqui uma clara tentativa de defender a dignidade das jovens mulheres, evitando uma excessiva sexualização e a automática sujeição (não é preciso estudar em Coimbra para somar dois mais dois) aos ditos e aparentemente gravíssimos piropos… Mais uma vez se vislumbram as contradições evidentes de um fenómeno partidário cuja notória decadência só espanta por ser tardia.
Aliás, a propósito do episódio mais recente, o sítio/blogue afecto ao BE (ESQUERDA.NET) reconhece e relembra as posições de 2009, associando o raciocínio ao caso de 2013; ou seja, como eu próprio disse nos meus tempos parlamentares, a conveniência e o lucro eleitoral são o único fio condutor de uma agremiação que foge da responsabilidade institucional como o diabo da cruz.
Contudo, não contornaremos a questão em apreço, dizendo que, mais uma vez, se encontram em jogo as questões de saber de distinguimos, sem maniqueísmos, o certo do errado e o mundo ideal do mundo real. Começando pela última, diria que num mundo ideal, cada um usaria (ou não) o que muito bem entendesse, sem que isso pudesse trazer consequências nefastas, fosse no plano do assédio, fosse no domínio da ofensa à moral pública, fosse ainda na estruturação de um personalidade que entenda e respeite regras de conduta. Sucede que entra aqui a mesma variável de que Marx (o Karl e não qualquer dos irmãos homónimos) se olvidou: o ser humano, a sua imprevisibilidade e o seu egoísmo inato (parto, claro, de um certo pessimismo antropológico), coisas que explicam a necessidade de regular a não menos necessária convivência social.
Depois, temos que perceber se ainda acreditamos que há coisas que estão certas e outras que estão erradas. Tenho escrito que entendo que a civilização ocidental me parece ter entrado numa deriva relativista em que qualquer opinião é válida por ser emitida por um sujeito determinado e em que os valores perdem a essência de marcas de sinalização do comportamento, porquanto valem o que cada nação, organização ou sujeito entender que elas valem.
Como explicarei na próxima semana, sou dos que entende que ainda há referências inegociáveis. 

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Culpa e independência


          Procurando fugir à repetição do que outros fizeram com uma qualidade que não poderia alcançar, sobre as eleições autárquicas procurarei, desde logo, transmitir sensações que me foram percorrendo ao longo de uma jornada feita de RTP Internacional e outras fontes na Internet.

Desde logo, sobretudo do lado do PSD pareceu-me, embora digno individualmente, colectivamente “de faca e alguidar” o afã de muitos derrotados em assumirem a título pessoal as respectivas desfeitas… Não só era evidente o castigo ao Governo (o Primeiro-Ministro reconheceu-o, com a sua honestidade habitual) – assim tornando, no mínimo, os oradores em maus analistas políticos – como o rasgar de vestes faria sentido em muitas outras coisas erradas que há na política hodierna, categoria em que uma derrota democrática, seguramente, não cabe.

Aliás, creio que algumas vitórias independentes também têm a ver com essa decadência ética da vida pública, sobre a qual venho falando. Creio, porém, que o fenómeno de rejeição partidária não explicará tudo sobre o crescimento de listas independentes; entendo que “a coisa” se não faria sem que houvesse uma clara apreciação das propostas e dos candidatos em casos como Matosinhos, Portalegre ou Porto. Já no caso de Oeiras, como o vencedor com a humildade que devem ter os que ganham reconheceu, terá havido um interessante fenómeno de vitória por procuração, o que também diz bastante sobre a apreciação da obra feita e sobre a lealdade do eleitorado aos que sente como seus.

Dentro da latitude de opinião que posso ter, diria sobre a vertente partidária e em primeiro lugar, que houve, mormente no PSD, cuja realidade ainda vou conhecendo, e sobretudo ao nível local, uma caça aos que pensavam por si próprios e que não dependiam de qualquer aparelho para ter uma carreira profissional. Consequentemente, pese embora se tenham partidos mais tranquilos, o debate de ideias está empobrecido, como o está a auscultação fidedigna do que pensam as nossas gentes.

Depois, creio que a tal culpa voltará a ser coisa em estado gasoso que se esfumará em pouco tempo. Sem ponta de comoção assisti a muitos discursos de derrota que sei que vão pertencendo a muitos que lá continuarão a carregar com essa cruz que é estar no Parlamento ou outros lugares políticos, continuando a impedir o rejuvenescimento de protagonistas.

No distrito de Coimbra, a evidência falará por mim, excepto, creio, numa verdade que tenho como tal, mas a que muitos se encarregarão de fazer vista grossa: creio que, daqui a quatro anos, o candidato à capital de distrito já está no terreno de jogo e que é chegada a sua hora (com o meu aplauso frenético); assim o próprio tenha método, paciência e ambição, já que a devoção a Coimbra ninguém pode negar-lhe.