domingo, 29 de abril de 2007

E nós a vê-los passar...

Andei que tempos a pensar que personagem histórica me fazia lembrar o desempenho mais recente do dr. Marques Mendes, e eis que o adorável Wile E. Coyote da Warner me fornece a matéria prima: é alguém com quem simpatizamos, que persegue com denodo alguém que parece ser sempre mais lesto e cujas iniciativas, algumas das quais academicamente interessantes, dão, quase invariavelmente, asneira.
Vem isto a propósito de um texto da Dulce, no qual aceita como boa a atitude de Marques Mendes sobre as habilitações literárias de José Sócrates. Eu discordo, por duas razões: a primeira tem a ver com o facto de, depois dos necessários comentários iniciais, a polémica ter servido para distraír o País dos problemas cruciais. A segunda prende-se com a ideia que sempre tive de que alegações sobre o carácter alheio são último recurso e exigem provas, o que Marques Mendes não produziu.
Encadeando isto com o último debate parlamentar, sublinho que acho digna do Coiote a proeza de, com o Primeiro-Ministro sujeito a essa e outras contrariedades e com o CDS ainda em cacos, o Presidente do PSD ter conseguido ser novamente "espancado".
Pegando no caso das habilitações de Sócrates, o mínimo a fazer era não cair na armadilha do Bip-Bip do PS e ter-lhe dito na cara o que dissera nos jornais. Continuaria a discordar, mas aproveitava-se-lhe a coragem e a coerência.
Por fim, verifiquei que se consuma o fecho da tenaz composta por dois mestres do mediatismo: Sócrates e Portas. Para quem acha que o cinzentismo do século XX ainda cola no seguinte...
De uma ou de outra a caloira do "Lodo" tem razão: há que meter a casa da oposição em obras.

sábado, 28 de abril de 2007

Oposição"zinha" *

A oposição institucional, feita no seio das instituições democráticas como o é a Assembleia da República, é nos regimes democráticos o instrumento de trabalho dos que ficam de fora do Poder Governativo.
A estes 'sobra-lhes' (não menosprezando...) o Poder Legislativo a exercer na AR, acrescido de um outro poder/dever, que é o de “fazer oposição”.

Volvidos dois anos de Governo Socialista, o maior partido da Oposição, ou “o estado-maior de Marques Mendes”, como alguém o denominou, continua a ser oportuna e justamente acusado de fazer uma Oposição débil e muito aquém do desejável.

Em dois anos, Marques Mendes só se mostrou realmente preocupado e exaltado aquando da recente polémica das habilitações literárias do Primeiro-Ministro. Só se pronunciou com fervor e determinação para falar sobre matéria curricular, particularmente, a do homem cujo actual cargo ele deseja para si já em 2009.
Muitos não concordaram com este 'abespinhar' de Marques Mendes, como o companheiro Gonçalo aqui do Lodo. Eu considerei oportunas e sensatas as atitudes e exigências feitas pelo líder social democrata face à questão 'Independente'. Mas tristemente constato agora que esta súbita determinação e esta vigilância de Mendes, qual sentinela, foi sol de pouca dura...

Mais à direita, o CSD de Ribeiro e Castro também não se destacou na Oposição e deixou-se esmorecer (leia-se: adormecer) nas confortáveis cadeiras do Parlamento.
Já o recém ressuscitado Paulo Portas, regressou ao Parlamento na passada sexta-feira, dia de Debate Mensal, para cumprir o prometido: “fazer oposição institucional e popular”.
Mas ficou um pouco aquém da promessa e deixou até que Sócrates ironizasse os seus ultimatum's...

Quanto ao Quarto Poder, esse (salvo raras e benditas excepções…) continua a "levar ao colo" Sócrates e o seu (des)Governo.
Se a Oposição se mantiver murcha e passiva, na Assembleia da República o PM, com ou sem canudo, parece ter a tarefa facilitada.
Perante esta 'ditadura Socrática' que já leva dois anos, só me ocorre uma solução, que irrompe precisamente nos finais do mês de Abril:
uma (r)evolução na Oposição.
É tão desejável, quanto indispensável...


* O título deste post foi “roubado” ao seguinte episódio:

- Então e fazer Oposição, não?..
Marques Mendes: - Faço Oposição todos os dias.
- Oposição«zinha»… Até o amigo Menezes, lá de longe, faz bem mais…
Marques Mendes: - Então siga-o…
- Pode crer que o sigo…


Não, não é ficção….
Foram as ‘amistosas’ palavras trocadas entre uma jovem militante social-democrata e Marques Mendes, no final do XIX Congresso Nacional da JSD. E ainda dizem que os jovens que integram juventudes partidárias são meros fantoches sem vontade própria, nem consciência crítica… …

quinta-feira, 26 de abril de 2007

Tens razão, pá!

Não conhecendo pessoalmente o senhor, Paulo Rangel foi uma figura que nunca me despertou grande simpatia mediática; fosse nos debates parlamentares ou na sua ida semanal à RTP, parecia-me sempre demasiado "cheio de si próprio" e um dono da verdade.

Contudo, o discurso evocativo do 25 de Abril - em que denunciou o takeover socialista dos media e das polícias - confirmou outra certeza que também acalentava: o homem tem conteúdo, o que, no seu grupo parlamentar, faz dele uma pérola, embora não única. Não fora o Presidente da bancada laranja um gentleman e diria mesmo que era homem a abater...

Ficam-me duas perguntas: por que é que Marques Mendes não atenta na determinação de Paulo Rangel?

Se Santana Lopes o conhecia bem, como é que entrou na lista (pura maldade, reconheço)?

O Google, a China e o livre acesso à rede

Gonçalo, no seguimento do teu comentário ao meu último post, e visto que levantaste um tema que considero extremamente interessante, resolvi trazê-lo ao prime time do Lodo (espero que não te importes!).

Gonçalo Capitão

“Interessante este texto...
Porém, como há sempre um reverso da medalha, é a mesma empresa - "Google" - que admite censurar a pedido do governo chinês, assim limitando o potencial democratizador da Net em homenagem ao lucro.
Em sentido contrário, fica a ideia de que não é preciso explorar e tratar mal para obter resultados. Bem ao invés... “


Entendeu o Google que pior que oferecer um serviço censurado seria ficar fora do mercado chinês, que a curto prazo, terá mais pessoas conectadas à Internet que os Estados Unidos.

Como sabes Gonçalo, para uma ditadura, não há maior perigo que a livre discussão e o livre acesso à informação, enquanto que para um site de pesquisa na Internet, a sobrevivência depende da confiança que o público deposita nele.

Tenho a impressão que a fraca (para não dizer inexistente) resistência ao regime comunista da China não deve ter sido nada fácil para a alta esfera do Google, indo contra a tal confiança que acima referi. No entanto, ao render-se às regras da China, o Google não só deu força ao debate sobre a censura na net (tema que ainda vai dar muito que falar), como abalou a sua imagem.

Não esqueçamos é que a censura na net é uma realidade e a China não foi pioneira nesta matéria, sendo disso exemplos a França e a Alemanha, onde são barrados (e muito bem) sites nazis ou racistas.

A diferença, obviamente para além do conteúdo, é que umas são decididas por democracias, enquanto que outras são impostas por burocratas que não se preocupam com o imperativo de prestar contas à sociedade.

Termino com uma pergunta Gonçalo, até onde deverá ir a privacidade e liberdade de quem procura informações na rede?

quarta-feira, 25 de abril de 2007

Ensaio geral

No passado fim-de-semana, li que o Presidente do PSD foi barrado à porta do Hospital de Estarreja.
Ora bem, numa altura em que o CDS ainda apanha os cacos da última disputa interna e o Governo tenta sobreviver aos sobressaltos relativos às habilitações do Primeiro-Ministro e à OTA, a conduta do challenger deve ser exemplar.
Disse o responsável pela instituição hospitalar que não recebeu qualquer pedido para uma visita de cariz político. Pode alguém com a ambições a liderar um País sujeitar-se a ter um staff que não prepara convenientemente sequer uma visita de oposição?
O problema é menor, reconheço, mas alimenta receios pelo amadorismo que encerra.
E depois, sublinho Marques Mendes, como muitos políticos, deveria adaptar-se ao seu estilo de comunicação do século XXI. Quero com isto dizer que, uma vez apanhado nessa situação delicada, deveria evitar gaguejar, aproveitando para se vitimizar e alegar que lhe estava a ser sonegada informação essencial.

Porém, nem uma nem outra: apanhado em falso, desvalorizou o que, obviamente, iria ser notícia.
Repetindo que não é essencial, espero que seja parte do ensaio para que a peça seja bem representada, quando e se chegar à liderança do Governo.

terça-feira, 24 de abril de 2007

sábado, 21 de abril de 2007

And the Oscar goes to…


Ontem, nas minhas incursões de zapping televisivo, fui parar à SIC Mulher e por lá fiquei, a ver a superstar Oprah Whinfrey. Confesso que o programa em si não me atrai, no entanto, o tema era qual a melhor empresa americana para se trabalhar, o que assim sendo, cativou a minha atenção.

O título foi atribuído ao Google. Não sei quais as variáveis que foram inseridas no estudo para se chegar ao resultado final, todavia, a crer na reportagem transmitida durante o programa, qualidade de vida é o que não falta a quem lá trabalha.
Tudo bem que estamos a falar de um trabalho criativo, mas desde refeitórios totalmente gratuitos para os colaboradores com comida de qualidade, ginásios, infantários, piscinas, campos desportivos, salas para videojogos, entre outros, mais me pareceu um campo de férias do que propriamente uma empresa com fins lucrativos. Aliado a tudo isto, acrescente-se altos índices de satisfação e produtividade, que segundo um dos fundadores, se deve a este tipo de políticas laborais.
A reportagem terminou com a apresentadora a dizer que o Google recebe diariamente 1300 currículos de pessoas que se mostram interessadas em trabalhar na empresa.

Incentivado pela reportagem, fui à procura das melhores empresas para se trabalhar em Portugal, o que note-se, são sempre atribuições altamente subjectivas, não só por força dos critérios que se possa colocar no modelo, como também das expectativas, que como sabemos varia de indivíduo para indivíduo.
A pesquisa não foi difícil, bastou-me folhear uma revista que habitualmente compro, e sorte das sortes, lá vinha na página 53 um ranking com as melhores empresas para se trabalhar em Portugal.

O Oscar mais apetecido foi para a imobiliária Cushman & Wakefield, ficando a Danone com o Oscar de melhor empresa para os jovens, enquanto que a Amgen contentou-se com o galardão para melhor empresa para as mulheres. Desafio Global para os fornecedores, Martinfer a que mais contratou e a consultora Accenture ficou com estatueta para melhor empresa para os executivos.

A título de curiosidade, aqui fica o Top 20 Português, de forma ascendente. De referir que o estudo que chegou a estas conclusões foi coordenado pelo Great Places to Work Institute e que abrangeu mais de 200 empresas.

CUSHMAN & WAKEFIELD
MICROSOFT
AMGNEN
BMW
LIBERTY SEGUROS
REAL SEGUROS
MAPFRE SEGUROS
HUF
MARTIFER
BRISTAL MYERS SQUIBB
ACCENTURE
DIAGEO
AUTO-SUECO
EVERIS
DANONE PORTUGAL
LUSITÂNIA
PRICEWATERHOUSECOOPERS
JOSÉ JÚLIO JORDÃO
AMORIM IMOBILIÁRIA
DOMINGOS DA SILVA TEIXEIRA

terça-feira, 17 de abril de 2007

Custa, mas tem que ser...

A verdade é que, entre várias pantominas, José Sá Fernandes vai sendo uma voz útil na Câmara de Lisboa.

Ante o desnorte reinante, devem os lisboetas (em que me não incluo...) ficar satisfeitos por terem um "vigilante" com isenção.
Depois da denúncia da tentativa de suborno pela Bragaparques, esta resistência à capitulação perante os projectos imobiliários dos clubes de futebol (no caso foi o Sporting, mas vale para todos) foi louvável e faz nascer a esperança de que esteja a findar a tolerância para com a relativização do bem-estar de todos em favor de grupos de interesses.
Se a Lei diz "espaços verdes e equipamentos sociais", não deve ler-se "100% betão", como se tem feito ao longo dos anos...
Ao que cheguei!... Elogiar o Bloco de Esquerda... Consola-me (pouco) o facto de Sá fernandes ser independente...

Bem feitinho


sexta-feira, 13 de abril de 2007

Adepto me confesso


Estavas a ir tão bem...

O dr. Marques Mendes costumava dizer, com amizade e por graça, que eu sou do "contra".
Talvez por me ter criado uma dúvida existencial, tenho olhado com a benevolência de que sou capaz o seu mandato à frente do PSD (por exemplo, depois de no Congresso ter sido acusado de "traidor" e outras coisas por um dos seus servidores mais próximos, embora não directamente, pois a coragem não dá para tanto, remeti-me a um silêncio reflexivo nos Conselhos Nacionais seguintes, para ver se o problema era mesmo meu).

Porém, quando até parecia ir "benzinho" - parece-me que estava a cavalgar bem a onda da OTA - esta de pedir um inquérito ao currículo académico de José Sócrates soa, salvo o devido respeito, a aselhice e falta de jeitinho...

Podemos entender que o Primeiro-Ministro não se explicou convenientemente. Podemos até pensar que a licenciatura levanta dúvidas. Mas, no fim do dia, nem um só dos problemas do País será resolvido, mesmo que se apure que Sócrates prestou declarações incorrectas.

É com pena que digo que a posição mais equilibrada, quanto a este caso, foi a do PCP, que foi exactamente neste sentido: dizer que não se acha esclarecido, mas sublinhar que "bater mais no ceguinho" distrai dos problemas essenciais.

Mensagem ao Parlamento

Mais do que nunca, creio que este livro deveria ser distribuído gratuitamente aos deputados, aquando da entrega da pasta de documentação, que sempre se oferece na tomada de posse. Eu li antes...

quinta-feira, 12 de abril de 2007

Sai Azar (VI) - O Espelho e o Espalho da Nação (Epílogo)

E chegamos ao fim da saga (“finalmente”, dirão alguns) sobre a vitória do Doutor Salazar em “Os Grandes Portugueses”, aproveitando eu para pedir desculpa aos colaboradores e leitores do "lodo" por ter ocupado tanto espaço. Confesso que, a propósito do concurso, não resisti a fazer o ponto de situação do meu pensamento sobre o Portugal de hoje (a culpa, porém, também foi de quem me desafiou).
Pegando na deixa do último texto, entendo que a mediocridade de muitos dos nossos políticos (algo que motivou um voto de protesto em Salazar) reproduz apenas, em edição revista e aumentada, a mesquinhez da nossa vivência enquanto povo.

Começando, comme il faut, pelo início, atribuo a vários excessos pós-revolucionários alguns dos males de que padecemos, embora não o faça de forma exclusiva. Diz-se que, ao tempo de Salazar, éramos um povo sem qualificações académicas e atrasado nos hábitos de sociais, mormente pela clausura a que o País se encontrava sujeito. Creio que é verdade.

Todavia, não deixo de afirmar que o 25 de Abril, com os excessos próprios dos períodos que se seguem a qualquer revolução, trouxe o erro de liquidar as elites, procurando, pela lamentável inspiração marxista que dominou muitos dos arautos dos novos tempos, instituir uma ordem em que fossemos todos iguais, no pior sentido do termo. Se é bom que o sejamos no plano dos direitos, liberdades e garantias, a verdade é que só por estupidez nos acharemos igualmente capacitados a desempenhar o mesmo papel na vida; nem num grupo de amigos, quanto mais num país…

Era a época dos saneamentos, das passagens administrativas nas universidades (estão tão caladinhos, muitos dos que se entretêm com a Universidade Independente…) e do Estado estilo “vaca leiteira” que, ainda hoje, dá de comer a muita gente, num paradigma que terá o seu corolário máximo na “tigela de ferro chinesa” (um emprego que vale para a vida e que sustenta uma família), sendo que mesmo essa já começou a “enferrujar”.

De caminho, com a perseguição às elites (as humilhações que sofreram, por exemplo, alguns professores da Universidade de Coimbra, se calhar, às mãos de muitos que, entretanto, se aburguesaram), destruíram-se referenciais de valores. Podemos discordar da pauta ética da vida cívica do Estado Novo, mas ainda havia gente com trato social elevado, inclusive entre as pessoas de baixa instrução e de magras posses. Ao invés, a lógica do “é proibido proibir” (a versão high tech desta atitude anarca é o Bloco de Esquerda) favoreceu o laxismo e a libertinagem, não sendo de espantar que se degradem até os mais banais padrões de cortesia e o próprio requinte na afectividade.

Contudo, baralhando e voltando a dar, há muitas explicações que devem buscar-se em tempos anteriores. Começo por algo que já li e com cuja essência concordo: gostamos muito de ser tutelados. Se, a um tempo, queremos ser livres para tudo e mais alguma coisa, não nos importamos de ter um “paizinho” que olhe por nós. Dito de outro modo, queremos que as coisas se vão fazendo, sem que tenhamos a maçada de fazermos a nossa parte na construção de uma sociedade melhor e mais próspera (assim, com empenho de cada um se explica, a meu ver, a vibrante vida cívica, entre outras nações, dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha).

De um modo empírico, e num cenário indubitavelmente democrático, encontro paralelos nas maiorias absolutas de Cavaco Silva (1987 e 1991) e de José Sócrates (2005). Com as devidas distâncias entre eles, falamos de personalidades fortes e, concorde-se ou não com o rumo, de homens de reformas que preferem quebrar do que torcer, correndo, quando necessário, sozinhos e contra o vento. Sendo que os dois contrariaram a tendência do método de Hondt (que favorece mais a representatividade do que a governabilidade), parece-me que, nesses três momentos de aclamação sufragada, nos reencontrámos com a nossa idiossincrasia. Passámos procuração a cidadãos ilustres para que, mesmo a custo de alguma qualidade de vida (veja-se o caso actual), fizessem o que havia e há para fazer, sem que nos maçassem ou macem excessivamente com consultas frequentes.

A culpa é dos dois? Não.

Governaram mal? Até 1993, sei que não, no primeiro caso. Esperemos para ver, no segundo.

Vem mal ao mundo deste nosso gosto pelo “pau e cenoura”? Sim, pois poderíamos eleger os mesmos cidadãos, sendo mais informados e mais participativos.

No fundo creio que combinamos o pior do liberalismo continental europeu (a ideia de que somos mais espertos do que a Lei e de que a Ordem existe para se moldar) com a essência latina, que nos leva a esquecer a “conta da mercearia” sempre que há Sol, festa ou futebol…

Cumprimos com medo da punição! Se há mais receitas fiscais, tal não se deve a uma noção mais apurada do bem comum, mas sim à maior agressividade da administração fiscal. Se diminui a sinistralidade rodoviária, não podemos saudar o maior civismo dos condutores, mas sim aplaudir o endurecimento das contra-ordenações e penas. Se há menos mordomias associadas a certos lugares públicos, não podemos congratular o ascetismo dos titulares, mas sim felicitar a maior vigilância mediática (embora entenda que estejamos a cair no extremo oposto: o miserabilismo populista).

E sejamos francos, embora todos gostemos de ser portugueses e não tenhamos dúvidas (eu, pelo menos, não tenho) de que Portugal é melhor pátria que se pode ter, sabemos que, em conjunto, temos uma tentação para sermos mandriões, invejosos e corruptos.
Que longe estamos da cultura do mérito... Seja para uma consulta médica, para publicar um livro ou para obter um emprego, mesmo na iniciativa privada, conhece algum país desenvolvido onde dê mais jeito do cá “conhecer alguém”, no pior sentido da expressão?

Voltando a um dos textos anteriores, creio que a Educação e Cultura poderiam curar-nos dos nossos males, mas, com a sua degradação acentuada, não sei se estamos ainda em condições de começar por formar os curandeiros…

O pior é que, nestes domínios, temos pouco tempo, já que ninguém tem saudades do que nunca conheceu. Já noutros, a vitória de Salazar deixou-me a pensar…

domingo, 8 de abril de 2007

Sai Azar (V) - A (falta de) classe política

O problema em torno da eleição de Salazar não cessa, contudo, de aumentar…
Li, há poucos dias, que mais um conceituado sociólogo do Instituto de Ciências Sociais (escola de prestígio) veio desmerecer o juízo feito após o concurso por e sobre os políticos, e fiquei com a sensação de estar a observar uma cadeia alimentar intelectual: a seguir à vitória de Salazar, os políticos desvalorizaram a escolha popular e os politólogos desacreditaram a opinião dos eleitos, sem contudo se deixarem enlamear pelo plebeísmo de dar razão às massas; no fundo, excepção feita aos participantes na votação da RTP, todos procuraram – vício bem português, diga-se – justificar o seu lugar pela diferença, como se dar razão a outro seja um crime de lesa ordenado…

Precatando-me contra analistas, políticos e espécies naturais afins, sublinho que esta série de textos nada mais representa do que a minha opinião. É com essa base “orgulhosamente só” que entro na causa mais ilustrativa do voto maioritária no Professor: um misto de mesquinhez popular com um juízo francamente negativo sobre a classe política dominante, sobretudo desde meados da década de 90 (a altura em que se apagaram os últimos nomes grandes da nossa jovem democracia).

Guardo o juízo sobre a “ontologia” portuguesa para o último texto, retendo-me na avaliação dos vários matizes da mediocridade que afecta boa porção da nossa nomenklatura política.

Desde logo, parece-me que há fenómenos de notório ancilosamento e senilidade do nosso sistema partidário, mormente no que toca à ala esquerda do PS e, prima facie, ao PCP. Falamos, como já recordei, no mesmo partido que, ainda em 1991, apoiava (quase isolado no panorama dos partidos comunistas europeus) o golpe de Estado de Ianaev contra Gorbatchev e, pior ainda, o mais reaccionário dos partidos lusos no que toca a reformas na Educação e a democratização da Cultura.

É, no mínimo, hipócrita que as cabeças alegadamente pensantes da esquerda passem anos a encolher-se como Drácula defronte do crucifixo quando se propunha ensinar, na História de Portugal, uma visão desapaixonada das II e III Repúblicas e, agora, corem de pudor ao verem a consagração do Presidente do Conselho, em parte, pela deificação exclusiva das características benévolas, parte das quais romanceadas, do seu consulado.

Recupero exemplos como o do Museu Militar de Viena, o campo de concentração de Auschwitz e o Museu de Chernobyl (em Kiev) para lembrar como outros povos lideraram corajosamente com dramas bem mais sérios do que o Estado Novo. Por cá, provincianamente, continuamos a pensar se fazemos um museu em Santa Comba Dão (por mim devia fazer-se inclusive com documentos cedidos pela Torre do Tombo) e deixamos que a sede da PIDE se converta em condomínio de luxo, num acto impar de burrice autárquica.

Depois, há um outro juízo que, a meu ver, os portugueses fizeram de forma implícita: a rejeição da actual classe política. Bem sei que, chegados a este ponto, brilham os sociólogos dizendo que se trata de empirismo não cientifico, mas também podemos pensar que não faria mal aos nossos cientistas ouvirem os portugueses nos cafés e nos transportes públicos, sem lhes apontarem um lápis ou um gravador à cabeça, algo que pode tirar alguma espontaneidade às respostas de muitos estudos. Procedendo assim veriam que, nos dias que se seguiram ao triunfo de Salazar, o que a vox populi mais verberava era mesmo a mediocridade dos eleitos, por muito que haja alguma injustiça neste veredicto.

Creio que, de facto, vivemos um período nebuloso em matéria de “sumo” político, já que o nosso sistema partidário se encontra quase exclusivamente nas mãos de uma geração – que andará, mais ou menos, entre os quarenta e poucos e os cinquenta e cinco anos de idade – que floresceu no pós 25 de Abril, predominante mas não exclusivamente, por via das juventudes partidárias e que aproveitou a miríade de oportunidades de participação política que o período pós revolucionário abriu. Era a época em que se respirava política e na qual os partidos e o Estado eram fartos em sinecuras políticas, que nem sequer eram tratadas com o desfavor com que, hoje e de forma algo fundamentalista, se olha toda e qualquer nomeação.

Resultado prático: falamos de algumas pessoas (não todas, claro) que não tiveram, realmente, uma profissão (por muito que escrevam qualquer coisa do género nos currículos oficiais) e que, desse modo, “matam” para permanecer nos cargos partidários e públicos, chegando ao ridículo de conseguir apoiar sucessivamente lideranças partidárias absolutamente incompatíveis, sem sequer fazerem um período de nojo recomendável; é como se fosse natural acordar a dizer que é preto algo que se jurara ser azul, ainda na véspera.

O caso pode agravar-se mais se à “carreira” política somarmos negócios que, não sendo necessariamente ilegais, jamais seriam encetados ou mantidos sem que se ocupasse determinado cargo que potencia influências, traficadas ou não. Não caindo na leviandade de acusar sem provas, convido antes a um exercício: acha que todos os políticos que vivem a dolce vita conseguem explicar tudo o que têm à luz do seu ordenado ou de heranças?

E mais: permanecendo, por vezes, há cerca de vinte anos nos lugares, gera-se uma espécie de endogamia em pessoas que só vêem os seus pares e cujo mundo, para usar uma expressão de Rui Reininho, “termina às Portas de Benfica”. Faz ideia, por exemplo, de quantos deputados não vão a um teatro, a um concerto, a uma exposição ou a um cinema? Passa-lhe pela cabeça o número de entre eles que já não sabe como se compra um bilhete de autocarro ou que não lê um livro? Sim, há gente que, aparentemente, tem no assinar do livro de ponto o mais esforçado exercício cultural, e juro que o sentimento com que escrevo é o de preocupação e não despeito por já não integrar o “plantel”.

Mas a pergunta impõe-se: qual o problema de haver uma geração de jovens turcos sem Ataturk que se perpétua? Muito simplesmente o facto de não haver renovação (turnover, como dizem os manuais de ciência política) que é tanto mais necessária quanto o mundo actual muda a uma velocidade nunca antes vista. Ou seja, começa a faltar quem interprete os tempos que correm com uma linguagem adequada para comunicar com eleitores já submersos pela cultura televisiva, o que obriga a uma mensagem estruturada em termos mais emotivos e mais longe das tiradas palavrosas e hieroglificas que os nossos políticos ainda apreciam.

O problema parece-me, aliás, longe de uma solução, se virmos que as lideranças, mormente as que conheço melhor, optam por purgas parciais e por critérios de favor na elaboração de listas que mais parecem distribuição de comendas. Em vez de se pensar nos elencos que temos de ter à chegada, privilegiam-se as palmadinhas nas costas à partida.

Mas, como disse antes, há algo de injusto no ar, se ficarmos por estas linhas. A verdade é que os cidadãos não podem esquecer-se de que os nossos políticos são assim porque são um mero espelho do povo a partir do qual emergem.

Os defeitos da classe política apenas são uma ampliação dos traços dos representados, sendo que a sua vaidade só existe porque há aduladores e a eventual corrupção só grassa porque alguém se deixa comprar… A isso iremos a título de epílogo…

Descubra as diferenças


O PNR resolveu surgir em cena e colocou em pleno centro de Lisboa um outdoor a criticar a actual política de Imigração do país. As "deixas" são claras: "Basta de imigração" e "Façam boa viagem", a roçar o tom xenófobo... reconheça-se.
Um dia depois, quatro jovens que estão mais habituados a estas luzes da ribalta que os senhores nacionalistas, satirizam o citado outdoor pedindo "Mais imigração" e desejando as "boas-vindas" aos estrangeiros.
Tendo o Marquês de Pombal como palco, esta novela muito tem dado que falar. E ainda agora começou...
Primeiro foi o choque do conteúdo do cartaz para uns, depois a ilegalidade da resposta dos "gatos". Agora, as ameaças que estes últimos tem sofrido acicatam a questão que já tomou contornos desagradáveis.
A liberdade de expressão (e portanto, a diversidade de opiniões) parece-me que pode justificar esta missiva do PNR, alertando para uma política de Imigração que poderá não ser a mais adequada para o país. Com efeito, concorde-se ou não com o conteúdo do outdoor (a meu ver, um pouco insensato...) a verdade é que um partido tem o direito de expressar-se sobre um determinado tema. Mesmo que a sua opinião desagrade alguns. E mesmo que usem expressões disparatadas como a do "façam boa viagem"...
Mas esta mesma liberdade de expressão deve servir igualmente para os quatro humoristas. De uma forma genial e acutilante, como já nos habituaram, os "gatos" têm exactamente o mesmo direito de usar a sua sátira como arma política. Eles não fazem política, mas sabem que podem desencadear um sem número de reacções políticas quando fazem (bom) humor.
A ver vamos é por quanto tempo mais, uma vez que sempre que resolvem pôr o dedo na ferida, aparece alguém a querer pôr à prova as suas sete vidas...

terça-feira, 3 de abril de 2007

Sai Azar (IV) - O Porquê da Coisa

E, não ignorando o dito fenómeno, tento buscar algumas das suas causas, começando pelas mais genéricas.

Antes, porém, confesso que acho alguma graça a quem o faz, desvalorizando a grandeza da amostra ao dizer que foram apenas 50.000 pessoas (números redondos) a votar no ditador, esquecendo-se de mencionar que as muy rigorosas sondagens convencionais têm amostragens, por vezes, cerca de 50 vezes menores (várias não chegam às mil entrevistas), com a agravante já mencionada de, sendo directas, a pergunta poder intimidar; é dos manuais, para quem estude sondagens, seja a pergunta sobre Salazar, aborto ou qualquer outro tema polémico e abrangido pelo “politicamente correcto”…

Voltando ao tema, entendo que não se trata de um surto de salazarismo. O corporativismo de Estado é um fenómeno datado e Salazar mais o é, por razões óbvias. Não me passa pela cabeça que 99,9% dos que votaram no cavalheiro de Santa Comba Dão pensem realmente que o podem trazer de volta ou sequer que saibam o mínimo olímpico sobre os ditames das políticas levadas a cabo no período histórico que vai de 1926 a 1974.

A contrario, diria que não vale a pena censurar os putativos apoiantes do Doutor Salazar, dizendo que muitos “só falam assim, porque não viveram naquele tempo”. Creio que não é preciso ter andado pelas estepes com Átila ou ter ido à escola com Mussolini para saber o que fizeram de mal; isto é, quem apoiou Salazar, independentemente das suas recônditas motivações, fê-lo, por certo, sabendo que, no Estado Novo, houve atropelos aos direitos humanos a par de realizações benéficas, por muito que não consiga detalhar qualquer um deles.

Destaco, em particular, uma estudante de Coimbra (ironia do destino, a Escola que formou Salazar e este vosso criado, salvas as devidas distâncias), cujo depoimento, que escutei num programa radiofónico do dia seguinte, era explícito: concordava com o resultado do concurso, entendia que o estudo da Eurosondagem visava branquear o mesmo, além de lamentar que Portugal fosse, hoje, gerido pela corrupção e pela cunha, que se fizessem fortunas na política e que se roubasse de uma forma que Salazar nunca permitiu, no seu tempo. Mais acrescentou que o problema não é do povo, já que o mesmo povo academicamente desqualificado projectou o Luxemburgo para altos padrões sociais, uma vez que a classe política local sabe dirigir; ou seja, queria a jovem coimbrã (pelo menos dos bancos da faculdade é-o) dizer que os políticos actuais não prestam.

Mas nem a política internacional lhe escapou, pois rematou com uma ilação sobre a hodierna subserviência a George W. Bush, por contraponto à recusa de António de Oliveira Salazar em vergar-se aos americanos.

Ora bem, retomando o fôlego, digo-vos que me vou escusar de comentar os pontos mais panfletários, concluindo que a nossa estudante está meia certa e meia errada. Fico-me pela primeira metade, concluindo-se sobre a outra pelo silêncio.

Entendo, desde logo, que diagnostica bem, embora não prescreva a terapêutica adequada, o mal do nosso povo: débil Educação e fraca Cultura.

Quanto à Educação, começamos a entrar num beco sem saída: à medida que se retiram os que ainda sabem ensinar, emerge uma nova geração de docentes (com excepções pela qualidade, claro) que já foi vítima da massificação selvagem do nosso ensino superior e da degenerescência ética do pós 25 de Abril, em que procurou contrariar-se o espartilho censório do regime deposto com uma lógica de “é proibido proibir” que, em muitos casos, transformou liberdade em libertinagem.

Culpas?! Se adiantar apurá-las, são do PSD e do PS que, em 30 anos, ainda não conseguiram impor uma metodologia de ensino exigente e de qualidade. No caso do PS, por preconceito ideológico da sua ala esquerda, a tendência é, bem ao invés, no sentido de um calamitoso facilitismo para não “traumatizar os meninos” e, algo que é comum ao PSD, para conseguir níveis de sucesso escolar que enganem os rankings da União Europeia (digo “enganem”, porque cada vez se sabe menos sobre tudo e mais alguma coisa…).

Já na Cultura o panorama não é melhor, aqui com menos culpas do PSD do que do PS e da esquerda, em geral, já que o primeiro partido, com o CDS, procurou, pelo menos, democratizar o acesso aos bens culturais.

O problema é que o nosso Orçamento de Estado, no capítulo cultural, é terceiro-mundista, nunca chegando a 1% (sim, disse bem: um por cento!) do total. E mais me preocupo quando, como sucedeu no último conselho nacional do PSD, um afamado deputado e conhecido santanista (ainda os há, é verdade…) disse, na sequência de uma intervenção do presidente do partido, que a Cultura não era um tema relevante. Ora, perante tamanha mostra de atavismo político, resta-me sublinhar que, no século XXI, em países como Portugal, só com uma fortíssima aposta na cultura poderemos preservar a nossa soberania.

Senão vejamos: as Forças Armadas e Policiais já não nos defendem em Vilar Formoso; hoje podemos ter militares e polícias a morrer pela nossa bandeira em Timor, no Afeganistão ou nos Balcãs. Acresce que a defesa da soberania é, para nós, integrada, já que não somos auto-suficientes (Espanha levaria horas a invadir-nos, se fosse o caso).

E mesmo o nosso tecido económico, como sabemos, está muito tomado por multinacionais estrangeiras, nem sendo preciso ir a qualquer parque industrial, já que qualquer centro comercial fala por si.

O que pode distinguir-nos, então, enquanto país pequeno e sem grandes recursos naturais, com excepção do mar? A mais da nossa idiossincrasia aventureira e criativa, recursos humanos muito qualificados e uma forte aposta no reforço da nossa identidade própria, que se consegue estimulando a conservação e invenção de cultura portuguesa.

E todo este sermão para quê? Para pedir que não se espantem, quando, à falta de tudo isto, os portugueses que, em 2007, se deram ao trabalho e ao encargo de participar no concurso votam em Salazar ora porque não estarão suficientemente formados e informados, ora porque entendem que estão mal servidos de políticos (algo que me parece certo, mas a que iremos mais adiante).

Para já, fico-me pela primeira parte da equação para sublinhar que acho delicioso que seja a esquerda a aspergir bílis sobre a ignorância dos que escolheram o político de Santa Comba Dão, quando é precisamente a esquerda – maxime a CGTP – o sector social mais reaccionário no que toca a mudanças na Educação. Seja o tema propinas, concursos de professores, disciplina dos alunos ou revisão curricular, o que se ouve do braço sindical do PCP é conservadorismo e nem uma só ideia nova.

E na Cultura, desgraçadamente, o cenário não é mais animador: responsabilidades assumidas no que concerne à direita, devo dizer-vos que a esquerda resume-se a propor aumentos acríticos, privilegiando o elitismo, já que pretende financiar peças com mais gente em palco do que na plateia e filmes para o realizador ver com amigos, em vez de procurar ver até que ponto é que as criações culturais pagas por todos estão realmente a aumentar o nível intelectual dos portugueses, em geral.

Resumindo e concluindo: se houvesse qualidade na Educação e na Cultura, provavelmente outro seria o “Grande Português”.