domingo, 25 de outubro de 2009

Uma aventura no Ministério da Educação

O astuto Primeiro-Ministro escolheu a dedo o seu Governo, com especial atenção a uma das pastas mais massacradas na legislatura passada. A Educação fica agora a cargo de uma cara já conhecida e figura muito apreciada pelas gerações de 70/80, que então liam de fio a pavio a colecção "Uma Aventura" e, com sorte, ainda tinham direito à visita das autoras à sua escola. Para além do que conhece por ser professora, as incursões que Isabel Alçada já faz há quase três décadas e a proximidade que teve com alunos e professores de muitas escolas deste país dão-lhe uma ideia daquilo que a espera. Conhece de gingeira os queixumes dos professores e as carências dos alunos e está agora em posição de atender a essas causas e de lutar por um melhor ensino. É uma grande e inusitada aventura, mas a escritora goza de um apreço que muito dificilmente perderá, mesmo que nem tudo corra pelo melhor. E é por isso que cumpre tirar a cartola a José Sócrates. Escolheu alguém cujo perfil profissional não deixa dúvidas de que se apropria ao cargo e cujo perfil pessoal cai bem na generalidade dos portugueses. Oxalá Isabel Alçada não venha a desiludir-nos.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Dignificar a advocacia

No site da Ordem dos Advogados convidam-se os 'colegas' a lançar sugestões para uma campanha comercial "com vista a dignificar e salientar a importância do exercício da advocacia na defesa do Estado de Direito e da cidadania".

Bem pode a Ordem promover campanhas, pretendendo publicitar e dignificar o exercício da advocacia junto da sociedade portuguesa, que o povo português dificilmente deixa de franzir o sobrolho perante um causídico. É triste para quem enverga a toga mas, bem vistas as coisas, é compreensível que se tenha em tão má consideração esta classe profissional.

O problema começa desde logo na proliferação dos cursos de Direito nas privadas, bem como no numerus clausus arrepiante das clássicas. Quanto à formação, melhor ou pior, é certo que os licenciados em Direito saem com enormes carências técnicas e, não raras vezes, é-lhes vedada a possibilidade de as treinar convenientemente nos estágios. Isto não os impede de se tornarem excelentes advogados, mas dá-lhes o rótulo de «tipos que só servem para oficiosas».

E depois, há os que sabendo não ter vocação, insistem na advocacia mesmo tendo noção de que não passarão de advogados medíocres. É com esses que os portugueses esbarram muitas vezes, com tipos que envergam o título de advogado como se de uma insígnia se tratasse, com tipos que menosprezam clientes, que perdem casos por incúria, que esquecem os escrúpulos e prestam um mau serviço ao clientes, à Justiça e ao país.

São estes que mancham o profissionalismo de todos os outros que não encaixam nesse lamentável perfil (vão sendo poucos...) e são estes os responsáveis pela pouca consideração que a sociedade tem para com esta classe. Embora seja de louvar o esforço da Ordem, isto não vai lá com campanhas.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Um serão de excelência

Tive o prazer de assistir, no âmbito do DocLisboa 2009, à exibição do excelente "Futebol de Causas", da autoria de Ricardo Martins.

Nele se retrata o cariz sui generis de Académica de Coimbra e a sua permanente relação com as causas estudantis e cívicas da década de 60, sem esquecer a referência à mítica final da Taça, de 1969.

Ocasião para rever as duas crises académicas, a eclosão do 25 de Abril e a passagem pela fase "Clube Académico de Coimbra", ditada pela decisão da extrema-esquerda de extinguir a secção de futebol da Associação Académica de Coimbra. Um paradoxo se olharmos à luta que as equipas da A.A.C. tinham travado pela democracia...

É uma obra a rever na RTP e a adquirir em DVD a que apenas deixo um reparo, pese embora com respeito pela liberdade criativa do autor: quando se diz que, mesmo depois de em 84 ter voltado a denominar-se Académica (agora enquanto organismo autónomo da A.A.C.), o nosso futebol nunca voltou a ser o mesmo, falta explicar que tal é impossível pela conversão do futebol em geral numa indústria, onde, apesar de tudo, entendo que a Académica ainda é bem diferente.

Dinheiro bem gasto


quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Sem emenda

Desgraçadamente, não creio que o PSD tenha emenda…

Apesar das mentes mais criativas do (meu) grémio laranja tenham gritado vitória em face do maior número de câmaras municipais averbado pelo PSD, o facto é que “voaram” 27 daquelas autarquias para o Partido Socialista, num cenário em que o PSD jamais deveria perder terreno, antes sendo de aproveitar a oportunidade gerada pelo descontentamento popular para reforçar posições e conquistar novas praças-fortes. Porém, depois de “conseguir” a obra-prima de perder as eleições legislativas, já era de esperar mais um auto-golo…

Comecemos no meu distrito de Coimbra. Primeira nota saliente é a perda de duas das quatro cidades para o PS - Figueira da Foz e Oliveira do Hospital – por causa de lamentáveis lutas internas do partido; ou seja, mais uma vez, os “donos” do PSD preferem pôr o seu umbigo e a sua ganância à frente dos interesses dos concelhos e suas populações. Parece-me até que já vi isto em algumas listas de deputados… E Penacova, que “só sabia” votar laranja?!

E mesmo a vitória em Coimbra, ante o resultado do PS, deve-se em grande parte ao carisma de Carlos Encarnação e à lucidez que teve, pela primeira vez, na aposta para a Cultura, restando saber se o Edil se empenhará na busca de um candidato forte para 2013, não só do seu ponto de vista, como na óptica da receptividade junto do nosso muito específico eleitorado.

Contudo, num plano extra-distrital, as razões para abrir a boca de pasmo são aos molhos, pois se compensa trocar Faro por Tavira e se é bom ganhar Felgueiras, ficam por explicar as escandalosas (não do ponto de vista da escolha popular, mas sim da gestão partidária, sublinho) derrotas em Leiria, Barcelos, Trofa, Vila Nova de Ourém (nem Nossa Senhora de Fátima nos valeu…) e, como disse, Figueira da Foz.

No fundo, creio que se trata do reflexo da calamidade autofágica que assola as hostes sociais-democratas, desde o fim do chamado “cavaquismo” (sendo que o seu mentor, de quando em vez, não se esquece de ajudar à festa). Problema decorrente terá lugar daqui a quatro anos, pois com as guerras fratricidas de muitos e a política de terra queimada de outros tantos que não preparam sucessores que vão além do “lambe-botismo”, creio que o PSD terá um mínimo de 83 problemas para resolver; tantos quanto os autarcas que atingem o máximo legal de mandatos consecutivos…

Em suma, meia vitória para o PSD, meia vitória para o PS e uma deliciosa e estrondosa derrota para o Bloco de Esquerda.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Rio, Rio, Rio [Rio para não chorar]

Eu até fiquei momentaneamente feliz quando o comissário (brasileiro, por sinal) anunciou em pleno vôo que o Rio foi a cidade eleita para acolher os Jogos Olímpicos de 2016. As outras concorrentes eram de peso (Tóquio, Madrid e Chicago) mas ainda assim o país-irmão levou a melhor, conseguindo que aquele gigantesco evento desportivo se estreasse na América do Sul e, pela primeira vez, num país de língua portuguesa.

E depois, depois lembrei-me que a Cidade Maravilhosa não é assim tão maravilhosa. Há favelas que florescem como cogumelos, criminalidade a rodos, miséria recôndita, prostituição a la carte, corrupção infiltrada por tudo quanto é sítio. E por muito que o BOPE actue, amuralhem as favelas e se abra caça a tudo e todos, não vejo que assim, do pé para a mão, seja possível tornar a cidade carioca num lugar mais visitável.

Por muito que soe a redutor, parece-me que o Brasil e seus governantes deviam ter outra espécie de prioridades. Estimam-se gastos de milhões em torno de um só evento desportivo (cuja pertinência e grandeza jamais poria em causa), mas que me parece despropositado num país que tem enormes carências, nas quais se devia concentrar toda a atenção, empenho, e claro, todos os reais.

Tenho para mim que os Olímpicos nestas circunstâncias só enchem olho a locais e forasteiros, são mais do mesmo para entreter as massas e tudo quanto se venha a fazer naquela cidade não é mais do que varrer o pó para debaixo do tapete.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

O lato conceito de «vitória»

A julgar pelas manchetes da imprensa de hoje e pelo que leio pela blogosfera fora, devo ser das poucas que considera que o PSD perdeu as eleições de ontem. Sei bem que arrecadou mais Câmaras que o PS, que conquistou Faro e que "arrumou" com Fátima Felgueiras, mas que dizer das derrotas em bastiões como Barcelos, Leiria e Figueira? Já para não falar da derrota na Capital, ainda que renhida, reconheça-se. No total, o PS 'roubou' 27 (sim, vinte sete) Câmaras ao PSD. E chamam a isto "vitória"?

E que dizer dos resultados a nu? Sozinho, o PS arrecadou 131 Câmaras, contra 117 do PSD nas mesmas condições (sem coligações). Quanto a Juntas de Freguesia, o partido do Governo venceu em1580 contra 1525 do PSD.

Um partido como o PSD, que tinha nas eleições autárquicas uma espécie de bálsamo quando as demais batalhas eleitorais não corriam pelo melhor (como sucedeu nas últimas legislativas) viu-se ontem fragilizado e logrou números sintomáticos do estado de desacreditação em que se encontra. Não estou em crer que isso se deva única e exclusivamente à sua líder. Bem pelo contrário, tenho para mim que o problema do PSD é centrípeto. Parte das células concelhias e distritais e vai atacando, paulatinamente, em direcção ao centro. Temo-nos concentrado em "lavar a cara", mas isto não se resolve com a eleição de um novo líder, desenganem-se os mais ingénuos.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Um bem-haja à função pública (grunf!)

Juro que bem tento não cair no cliché de dizer mal dos funcionários públicos só "porque sim". Até porque tenho uma irmã que trabalha (e muito) numa autarquia deste país e não vê meio de lhe ser reconhecido o mérito que tem e a entrega exemplar com que todos os dias (úteis e não úteis) se dedica ao seu trabalho. Adiante. Dizia eu que bem me esforço por não cair na generalização de criticar a função pública e de usá-la como bode expiatório só porque, como a generalidade dos portugueses, me sinto mal servida pelo Estado.

Sucede que esse meu esforço cai por terra sempre que tenho que lidar com essa estranha espécie que são os funcionários públicos. Por força do meu trabalho, vejo-me algumas vezes levada a ajudar clientes em assuntos que lhes cabiam a eles resolver mas que não conseguem, por falta de diligência dos funcionários do Estado e, sobretudo, porque lhes faltam algumas armas que se mostram necessárias usar com aquela gente.

Há dias, tentei estabelecer contacto com Direcção-Geral das Alfândegas e estive cerca de uma hora em espera, porque os sucessivos interlocutores alegavam sempre "que não era com eles" e passavam a chamada uns aos outros, sem réstia de consideração. Cheguei a falar com a mesma pessoa duas vezes e - nada que me surpreendesse - levei com um "então mas eu não lhe disse já que isso não era comigo?". Às tantas, quando lá encontraram a pessoa "certa" (que ali é a mesma coisa que dar com uma agulha no palheiro) e me deram o respectivo contacto, atende-me uma senhora cujos bons modos escasseavam e cuja mensagem foi suficientemente esclarecedora: "Agora estamos a almoçar, seja o que for, só depois das duas".

Ontem o cenário não foi muito diferente. Estive 40 minutos em espera para falar com determinado departamento da Câmara de Lisboa, para meu desespero e da telefonista que tentava, sem sucesso, passar o telefone às "técnicas que estão cheias de trabalho ao telefone". Até podia ser verdade, mas chegada a hora de me atenderem só sabiam dizer que "não era com elas", mesmo quando lhes relembrei que no anúncio do Diário da República era aquele exacto contacto o que se indicava para eventuais esclarecimentos. Até que me exigem a "coisa" por escrito, meu deus, que burocracia! Um email sem resposta (mesmo tendo rogado resposta rápida uma vez que o prazo da coisa assim o exigia) e uma tarde passada a ligar para lá, até que percebi que ainda nem sequer tinham lido o email e, tal era a fúria com que estava, lá coagi uma senhora a dar-me um número de telefone de alguém que me garantiu saber ajudar. Claro que tudo isso foi em vão, porque o senhor, mesmo sendo Director de Departamento ou raio que era, não sabia patavina! Ainda estou em choque, a perguntar-me que raio faz aquela gente, que nem sabe aquilo que exige aos munícipes!

Pois bem, não há volta a dar, a imagem depreciativa que tenho dos funcionários públicos teima em piorar de dia para dia e, razões, como bem vêem, não me faltam para isso. E assim dou por mim a desejar que tudo neste país fosse privatizado! Pronto, já um pouco mais calma concluo que bastaria aplicar as regras do privado no sector público e já seria um grande avanço...

Irra, que não há meio deste povo aprender!




"Luta renhida em Marco de Canaveses"

Já se viu que não é pela Justiça que se afastam os políticos acusados em processos criminais de concorrer, de novo, às eleições autárquicas. Também já se concluiu que tais personagens políticos não devem muito ao bom senso e, de novo e com o maior dos à-vontades, passam um pano sobre as aleivosias cometidas nos seus mandatos. E como se tudo isso já não bastasse, este povo continua a idolatrar (e a eleger!) esta espécie de autarcas que teima em reinar até mais não, com a falta de escrúpulos que lhes é costumeira e sem pingo de decência.

Isaltino Morais, Fátima Felgueiras, Avelino Ferreira Torres, Valentim Loureiro, Mesquita Machado e demais (maus) exemplos, todos eles me provocam náuseas. Esta minha aversão não é nova, já aqui havia dado sinais dela. Mas quem me deixa à beira de um ataque de nervos é mesmo o povo que os elege, os eleitores insensatos que de quatro em quatro anos dão poder a quem não os respeita, a quem deles se serve sem pudor, a quem os compra com obra de encher o olho. A sério que não consigo perceber como é que aquela gente não aprende. A célebre frase de Tocqueville cada vez faz mais sentido: «cada povo tem os governantes que merece».

Barack Obama: Prémio Nobel da Paz 2009


quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Loucura no deserto


Daquelas coisas que valem a pena...


Tarantino vintage

Já sabiamos

Visto que o não pude fazer na semana passada, gostaria partilhar algumas ideias sobre os resultados eleitorais para a Assembleia da República.

Assim, dadas a crise mundial que ocorreu (e ainda vai pairando), a contestação gigantesca que lhe moveram alguns sectores (professores e magistrados à mistura) e as polémicas em que procuraram envolver o seu nome (justa ou injustamente, decidirá quem é competente para o efeito), o resultado de dia 27 de Setembro é uma vitória para José Sócrates. Embora seja votante e tradicional eleitor do PSD, sempre achei, aliás, que a coisa não estava bem encaminhada... Eu e 40% dos 42 votantes na nossa sondagem eleitoral, apesar de se tratar, reconheça-se, de um blogue editado e lido por uma maioria de povo laranja...

O problema é que, pelos mesmíssimos factos que fui coligindo, esta era uma eleição que o PSD não podia perder, sendo fraco contento dizer que o PS ficou sem a maioria absoluta. Mesmo assim, restaria ainda saber se o feito de lha retirar pertence ao PSD...

A opção pela “não campanha” (nada prometer para nada incumprir) sempre me pareceu pouco perceptível e o tradicional clima fratricida do PSD fez o resto. O mais grave é que cresce o número de caciques internos que prefere ser rei de coisa nenhuma do que príncipe num reino de opulência, o que gera a dinâmica do “quanto pior, melhor”.
Essa propensão para a desgraça, acumulada com o descrédito mais genérico nos dois partidos crónicos de governo, tem, a meu ver, outra consequência: os resultados do CDS, PCP e BE mostram que a tendência para a bipolarização foi sustida, se não mesmo invertida. Temos, neste momento, cerca de 30% dos votos atribuídos a 3 partidos que podem vir a ganhar crescente potencial coligativo (algo que só o CDS tem, de forma isolada); dito de outro modo e estando ainda longe desse cenário, podemos caminhar para um fraccionamento crescente do sistema de partidos e para a erosão do espaço das duas maiores agremiações políticas.

Penso mesmo que, sendo o CDS liderado com a forma astuta que tem imperado (moderando o conservadorismo com medidas liberais e aproximação ao eleitorado urbano), o PSD pode vir, mais cedo do que tarde, a perceber que os partidos não são (longe disso) eternos. Basta que o grémio laranja continue a espremer líderes e a dividir ainda mais os gomos de uma laranja algo mirrada pela pouca exposição ao poder.
Como terceiro apontamento, sublinho que o eleitorado provou, embora não em medida larga, a sua sapiência ao moderar as expectativas do Bloco de Esquerda, que não só ficou em quarto lugar, como não elegeu deputados suficientes para chantagear politicamente o PS, como deixara perceber durante a campanha. Creio que teve vencimento a ideia de que o insulto, a maledicência e a inveja (algo que é estimulado em cada simulacro de trotskismo dos discursos do BE) não formam uma ideologia de governo.

Estaríamos, em conclusão, perante um cenário que reforçaria o papel do Presidente da República, não fora a forma infeliz como, em minha opinião, conduziu o dossier das alegadas escutas em Belém. E, neste caso, creio que, mais uma vez (eu fiz as campanhas de Fernando Nogueira e de Santana Lopes), o PSD que o projectou sai dorido das suas mãos.

Nota final para as autárquicas para saudar antecipadamente a natural vitória de Carlos Encarnação, que me renovou a esperança de bons ventos, se for verdade que a Professora Maria José Azevedo Santos será a responsável pela Cultura. Finalmente!...