terça-feira, 24 de março de 2009

Até um dia, Amigo

Há dias morreu um Homem… Assim mesmo, com “H” grande!...

Falo, como é óbvio, de João Mesquita, que fazia o favor de ser meu amigo, há muitos anos, e que falava comigo, desde o início (era eu dirigente local da JSD), com a mesma humildade e respeito com que lidava com a gente graúda da política.

Foi algo que sempre me impressionou… Como é que aquele homem, que fora Presidente do Sindicato dos Jornalistas e que sempre perfilhara causas políticas bem distantes das minhas, estava sempre disponível para me ouvir sobre os assuntos da actualidade local e nacional, quando achava que eu podia dizer algo de interesse, designadamente sobre a JSD, tratando-me com o mesmo respeito com que tratava um ministro ou um qualquer outro político “crescido”?

O mais incrível é que, com o aprofundar da amizade com que me honrou, não evitava uma crítica amiga nem regateava um elogio sentido, mesmo durante e após o meu desempenho na Assembleia da República. Aliás, saboreio ainda o excesso a que a amizade o levou ao escrever a dedicatória no meu exemplar dessa bíblia desportiva que é o livro “Académica – História do Futebol”, que concretizou com João Santana.

E, graças a Deus, sempre tive a iluminação de enaltecer o João, muito antes de conhecermos a maleita que no-lo roubou cedo demais… Sempre gostei particularmente de sublinhar que, da única vez em que lhe apontei o dedo (quando no “Independente” deu, mal informado por adversários, a notícia de que eu iria mesmo avançar para a liderança nacional da JSD, apesar de eu, peremptoria e previamente, lho ter negado), o João fez algo que jamais outro jornalista fizera ou fez, desde então (e lidara, lidei e lido com muitos, como calculam): pediu-me desculpa!!! E ali estava eu, um garoto, sem saber o que fazer, perante um imenso jornalista que mostrava a humildade que só assiste aos imperadores do civismo… Isto não falando nos milhares de qualidades que tinha para além desta, claro…

Depois e a mais das inúmeras causas cívicas em que se envolvia, havia sempre a nossa Briosa… Quantos amigos e amigas com quem combinava ir aos jogos fora de Coimbra (sempre fui a quase todos) me perguntavam quem era o “tipo de bigodes” que percorria as bancadas incessantemente, qual tigre enjaulado… Lá estava ele, João Mesquita, sofrendo pela Académica como se aquele fosse o último jogo.

Se algum dia conheci alguém a quem concedesse a alegação (que ele teve a elegância de nunca fazer, todavia) de que sofria tanto ou mais do que eu pela Briosa, ei-lo!!! E, por isso, fico contente por lembrar que o último jogo que o João viu foi o da vitória sobre o Trofense (abençoada Briosa, que soubeste despedir-te com um “beijo de golo” do nosso João Mesquita), sem saber que, no final, me despediria do João até que nos encontremos noutro mundo… E também me faz sorrir, já com saudade, a conversa que, na época passada, tivemos na entrada do Estádio da Luz e na qual lhe disse: “ó João, estive a pensar e concluo que nunca vi a Académica ganhar ao Benfica”! Recordo como se fosse hoje o sorriso terno que me dirigiu e as palavras que disse e que apontavam para estar na mesma situação, já que havia mais de cinquenta anos que tal não sucedia. E nessa noite linda, brindámos o Benfica com um olímpico 3 a 0!...

Já sei que o telefone não mais tocará para ouvir o clássico “tás bom, Gonçalão?”… Mas a minha memória vai continuar a “ligar-te”, João! Até um dia destes, amigo!

2 comentários:

PQ disse...

Belo texto.
Não partilho as suas posições políticas, fiz um trajecto diverso, mas aprecio a frontalidade, a humanidade, a forma clara e tolerante como expressa as suas opiniões.

Gonçalo Capitão disse...

Obrigado! Palavras importantes, acredite.