1. Sou, por princípio, favorável à criação de um instituto civil para a união de casais homossexuais - na tentativa de consagrar direitos, liberdades e garantias a todos os cidadãos - e por ver justiça na extensão de direitos sucessórios e patrimoniais aos homossexuais que desejam fixá-los nas suas uniões. O mesmo não impede, porém, a crítica à forma como o PS, juntamente com a Esquerda, geriu o processo, bem como às opções que tomou (e que acarretam consequências), num momento que classificou de histórico. Ainda assim devemos felicitar José Sócrates e o partido do Governo (não é todos os dias que cumpre uma proposta do seu programa).
2. A aprovação do casamento gay foi conveniente para o Governo. Durante as últimas semanas a discussão das matérias económicas (endividamento público, desemprego, problemas sociais, etc.) cederam espaço aos debates relacionados com a proposta aprovada na manhã de ontem. Mas daí não vem grande mal ao mundo. Afinal de contas acontece o mesmo quando joga o Benfica.
3. Foi claro o comportamento do Governo e da Esquerda parlamentar, no sentido de oportunidade que achou encontrar neste início de 2010. Como disse Paulo Mota Pinto «[o senhor primeiro-ministro] não encontrou tempo para vir a esta Assembleia apresentar, por exemplo, o Orçamento de Estado, mas encontrou tempo para vir apresentar a lei que consagra o casamento entre pessoas do mesmo sexo». Contas feitas, depreendemos que o momento encontrado foi aquele que o putativo aumento do número de subscritores do pedido de referendo pôde sugerir.
4. A proposta de referendo (ao qual me oponho) não teve, em muitos casos, uma oposição correcta. Refiro-me àqueles que interpretaram e propagandearam a eventual sondagem como um prenúncio homofóbico «da maioria face à minoria», como se de uma batalha se tratasse, em que os heterossexuais portugueses estariam prontos a mobilizar-se pela negação das prerrogativas implícitas à eventual vitória do 'sim'. Além disso, o argumento que relaciona a lei com a extinção da homofobia (tantas vezes usado pelos militantes do 'sim') seria pateticamente ingénuo, se não fosse tão demagógico – ou não creio o mesmo tratar-se um fenómeno social que, como todos os fenómenos sociais, não se retém com a lei.
6. O PS cometeu um erro, e não foi o ter desconsiderado a opinião do seu fundador. Obstinado em chamar de 'casamento' à união civil de casais gay, foi errado nos princípios, imprudente na agenda e falacioso no produto. Esmiuçando, o PS faltou ao princípio da igualdade, tal como surgiu na Antiguidade, está consagrado no ordenamento jurídico português e do qual se entende a fórmula equilibrada de tratar por igual o que é igual, e por desigual o que é desigual – o casamento é uma instituição cujos primeiros registos remontam à sociedade pré-estamental da Suméria, enraizada na cultura ocidental pelas leis judaico-cristãs e usada para definir a união de um homem com uma mulher (é uma definição milenar da História); imprudente na agenda, porque a nova lei tem a jusante a questão da adopção de crianças por casais homossexuais, cujo debate já iniciou tacitamente, provocando a celeuma de ontem nas bancadas do BE e do PEV; falacioso no produto, porque, no seguimento das linhas anteriores, o Parlamento não deixou ontem de aprovar (por opção própria!) um casamento de segunda, revelando desonestidade para com a comunidade homossexual e instituindo, por outro lado, uma nova desigualdade.
6. Esteve bem o PSD que, como quem procura a convalescença em dias enfermos, foi ao debate apresentar a proposta de criação da união civil registada – de resto, o instituto adoptado na Alemanha, na Aústria, na Suiça, em França, no Reino Unido, e em mais onze países da Europa.
2. A aprovação do casamento gay foi conveniente para o Governo. Durante as últimas semanas a discussão das matérias económicas (endividamento público, desemprego, problemas sociais, etc.) cederam espaço aos debates relacionados com a proposta aprovada na manhã de ontem. Mas daí não vem grande mal ao mundo. Afinal de contas acontece o mesmo quando joga o Benfica.
3. Foi claro o comportamento do Governo e da Esquerda parlamentar, no sentido de oportunidade que achou encontrar neste início de 2010. Como disse Paulo Mota Pinto «[o senhor primeiro-ministro] não encontrou tempo para vir a esta Assembleia apresentar, por exemplo, o Orçamento de Estado, mas encontrou tempo para vir apresentar a lei que consagra o casamento entre pessoas do mesmo sexo». Contas feitas, depreendemos que o momento encontrado foi aquele que o putativo aumento do número de subscritores do pedido de referendo pôde sugerir.
4. A proposta de referendo (ao qual me oponho) não teve, em muitos casos, uma oposição correcta. Refiro-me àqueles que interpretaram e propagandearam a eventual sondagem como um prenúncio homofóbico «da maioria face à minoria», como se de uma batalha se tratasse, em que os heterossexuais portugueses estariam prontos a mobilizar-se pela negação das prerrogativas implícitas à eventual vitória do 'sim'. Além disso, o argumento que relaciona a lei com a extinção da homofobia (tantas vezes usado pelos militantes do 'sim') seria pateticamente ingénuo, se não fosse tão demagógico – ou não creio o mesmo tratar-se um fenómeno social que, como todos os fenómenos sociais, não se retém com a lei.
6. O PS cometeu um erro, e não foi o ter desconsiderado a opinião do seu fundador. Obstinado em chamar de 'casamento' à união civil de casais gay, foi errado nos princípios, imprudente na agenda e falacioso no produto. Esmiuçando, o PS faltou ao princípio da igualdade, tal como surgiu na Antiguidade, está consagrado no ordenamento jurídico português e do qual se entende a fórmula equilibrada de tratar por igual o que é igual, e por desigual o que é desigual – o casamento é uma instituição cujos primeiros registos remontam à sociedade pré-estamental da Suméria, enraizada na cultura ocidental pelas leis judaico-cristãs e usada para definir a união de um homem com uma mulher (é uma definição milenar da História); imprudente na agenda, porque a nova lei tem a jusante a questão da adopção de crianças por casais homossexuais, cujo debate já iniciou tacitamente, provocando a celeuma de ontem nas bancadas do BE e do PEV; falacioso no produto, porque, no seguimento das linhas anteriores, o Parlamento não deixou ontem de aprovar (por opção própria!) um casamento de segunda, revelando desonestidade para com a comunidade homossexual e instituindo, por outro lado, uma nova desigualdade.
6. Esteve bem o PSD que, como quem procura a convalescença em dias enfermos, foi ao debate apresentar a proposta de criação da união civil registada – de resto, o instituto adoptado na Alemanha, na Aústria, na Suiça, em França, no Reino Unido, e em mais onze países da Europa.
[a imagem é daqui]
3 comentários:
Belo texto, Diogo!
Do que já escrevi e como calculas, concordo contigo!
Gonçalo, antes de mais aproveito para dizer que também gostei do teu artigo d' As Beiras, que está no sítio da plataforma cidadania e casamento.
Na verdade é pena que o debate tenha decorrido desta forma, com falta de contributos e (acima de tudo) diálogo, que fossem capazes de levar a questão além do mero 'a favor' ou 'contra', que um escusado rótulo de "fracturante" impõe neste tipo de matérias. Assim, o que se conseguiu foi um resultado no Parlamento que pode vir a comprometer
(por via de um eventual veto da Presidência) o mais importante do "projecto": a extensão dos direitos, liberdades e garantias em causa.
Sim, com a extensão de alguns direitos eu concordava. O que tivémos foi política panfletária.
Mesmo que o PR vete, a AR pode voltar à carga; e se o Tribunal Constitucional declarar a inconstitucionalidade da negação da adopção, temos a afronta completa.
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