Numa altura em que todos nos arrepiamos com os aumentos da taxa de juro decretados pelo BCE, há outra espécie de juro, aparentemente, mais indolor, mas pela qual, temo-o bem, viremos a pagar um preço muitíssimo mais penalizador.
Falo do preço que pagaremos, sem apelo nem agravo, por mantermos grande parte da classe política actual.
E nem se pense que falo por despeito ou eivado de súbito assomo de arrogância. Bem ao invés, falo procurando assestar baterias contra o comodismo de muito cidadão bem colocado na vida empresarial, profissional liberal ou académica que prefere o cifrão ou o artigo nos media a meter pés ao caminho. A lógica que subjaz a esta censura não é a de que todos temos de gostar de política, mas sim a ideia de Cícero de que o mal-estar social não desculpa o absentismo, antes clamando por envolvimento.
E é assim, largando o acessório, que explico a razão de ciência do que comecei por dizer: arrepiei-me de morte com o conselho nacional do PSD, no último fim-de-semana.
De facto, julgando eu que as intervenções de Cavaco Silva, Luís Filipe Menezes, Rui Rio e Nuno Morais Sarmento haviam “feito a festa, atirado os foguetes e apanhado as canas”, guardado estava o bocado.
Enquanto o engº Sócrates se passeia por toda e qualquer sondagem, e perante um confrangedor esforço do dr. Marques Mendes para ser escutado a propósito das razões de Estado, os mais diversos fidalgos (nem atribuo títulos, pois creio que os barões já se retiraram) do PSD entretiveram-se com uma questão crucial para o nosso futuro enquanto Estado-nação: saber se pode ou não criticar-se o líder do partido nos media e se isso é ou não fazer o “jogo da oposição” (dúvida de tal modo existencial que nem o dr. Mendes resistiu a filosofar a este pretexto)…
Se os meus amigos imaginassem os nomes consagrados da actual elite laranja que consumiram horas da sessão partidária a debater se deve ou não criticar-se o presidente, e em que sitio se deve dizer tudo e qualquer coisa, veriam que, por vezes, a realidade é pior do que o pesadelo.
4 comentários:
Caro Gonçalo
Estive como tu no Conselho Nacional.Partilho da tua opinião sobre o quão desmoralizadoras se estão a tornar estas reuniões do principal orgão politico do partido entre congressos.
Debate politico sério,profundo,gerador de politicas e alternativas...muito pouco.
Floreados,gracinhas,números encomendados e "macaquices" para o "chefe" ver isso vai havendo.
Com fartura.
Sendo que no aspecto das "macaquices" do género "olhem para mim que estou aqui",existe uma estrela em ascensão imparável.
Macário Correia.
Como é possivel ?
Quanto ao dr Luis Filipe Menezes posso garantir-te (admitirás que sou fonte informada nesta matéria)que não tencionava sequer abordar o assunto do sagrado direito de qualquer militante discordar do lider.
Porque no nosso partido sempre foi assim.
E Marques Mendes,quando lhe interessava,usou e abusou desse direito.
Contudo,como recordarás,foi o próprio MM a pegar na matéria(insolita estratégia para um presidente da CPN)logo secundado pelo inefável Macário,qual boneco de ventriloquo,e ai LFM limitou-se a repôr os factos tal como eles são.Sem precisar de skip para os branquear...
De resto falou do Pais,do governo,dos problemas que existem,em suma,falou de politica.
Se outros não o fazem ou nem lá aparecem é problema deles.
Caro Luís,
Agradeço o teu "ponto de ordem". Reconheço sem problema algum que este texto tem pouco ou nada a ver com o dr. Menezes e até com o dr. Mendes, que se confrontam como devem confrontar-se dois "candidatos ao título".
O pior é que daí para baixo falta massa crítica ou, quando ela existe, consome-se nestas questões de mercearia.
Tenho 35 anos, mas mais de metade passados na JSD e no PSD, pelo que é idade que chega para ter saudades de plenários concelhios, distritais e nacionais em que se discutiam questões de substância com argumentos de filigrana política.
Que nostalgia ao lembrar, por exemplo, os debates e embates de Nogueira com Dias Loureiro e de Calvão da Silva com Costa Andrade...
Bem... A solução é continuar a nossa "longa marcha", para ver se o PSD sai desta "longa noite de mil anos"; isto é, da sua Idade Média!...
Gostei dessa imagem da Idade Média.
Tal como então o Rei tem corte,bardo,trovador e alguns bobos !
Mas é verdade o que dizes; há muita falta de debate interno qualitativo.
E há uma confrangedora tendência para confundir o direito a discordar com perigosas conspirações contra a liderança.
Como se por acaso não fizesse parte do nosso patrimonio histórico o direito a pensae diferente.O meu receio,Gonçalo é que" fraco rei faça fraca forte gente".
Esperemos que não
Só hoje li este post e os respectivos comentários. Não podia haver "melhor" maneira de começar o ano no que ao PSD me diz respeito.
Peço desculpa. Estive a soltar um longo suspiro e a contar até 20 para ver se esqueço o que acabo de ler. Afinal é preciso stamina para aguentar mais 362 dias!!!
Enviar um comentário