terça-feira, 10 de janeiro de 2006

Idade Média

Há pouco tempo, em viagem, falava com um amigo que se queixava do panorama de Coimbra, no plano da política, da cultura, da comunicação social, do futebol, e por aí fora...

E a verdade é que, sendo Coimbra uma cidade com altos padrões de qualidade de vida, é-o apesar de muitos dos supostos timoneiros da nossa barca (permita-se o registo intimista ou unplugged, para usar a terminologia MTV), que é como quem diz que as elites da cidade se arredaram ou foram arredadas do comando dos nossos destinos.

Em ocasiões anteriores já falei e escrevi sobre o PSD, referindo a curiosidade que representa a distância do meio universitário, dos médicos e advogados e outros profissionais liberais prestigiados (muitos dos quais aceitam ser mandatários e afins, quando vislumbram prestígio suficiente na missão), dos agentes sindicais e patronais, em relação à sede do Partido. Não que os aspirantes a "jovens turcos" (apesar de tudo, os originais deixaram marca perene) não tenham a legitimidade, ao menos, formal: ganharam eleições internas pelo voto, eliminaram a competição e espraiaram os seus braços (não contem comigo para escrever "tentáculos"). O facto é que devemos retornar à essência do fim do sistema partidário.

A meu modesto ver, um partido político democrático deve, em primeiro lugar, oferecer um ideal social, aos mais diversos níveis geopolíticos e aos vários escalões etários. Os cidadãos devem perceber, no plano nacional, distrital ou concelhio, que modelo de sociedade resultará de uma prolongada governação daquela agremiação, e como se concatenam as medidas avulsas para o construir dessa sociedade nova.

Entenderá diferente quem tiver vistas curtas, falta de estudo ou oportunismo mediático (como bem percebeu, por exemplo, o Bloco de Esquerda).

Em segundo lugar, um partido deve estimular a divergência interna de opiniões e tolerar o debate externo. Quem discorda deve ser convidado a colaborar e a enriquecer a posição comum, sendo até uma boa maneira de responsabilizar a possível oposição pelos destinos comuns. Parece óbvio?! Acredite que não é, em muitos estádios da vida de um partido.

Depois, entendo que as pessoas devem evitar a inveja. A atitude persecutória das elites é típica dos períodos pós-revolucionários, mas não de democracias maduras. Só mentes pouco brilhantes e com o civismo a terminar na carteira ou no umbigo podem entender que é pendão a ostentar a expulsão das figuras de relevo ou, no limite, a sua não sedução para aderirem à vida partidária.
Fala-vos um tipo que, não se considerando parte da elite, tem pena que se não guarde para ela um lugar de relevo, já que entendo que um catch-all party (um partido consociativo de massas) deve ser verdadeiramente pluralista, se ambiciona espelhar a vida social que procura servir. Não defendendo qualquer teoria elitista (embora saiba o que dizem Paretto e Mosca), creio que as elites ajudam a manter o dinamismo do debate, num dado meio.

Um périplo pelos cabeças de lista de Coimbra de três dos grandes partidos às últimas eleições legislativas é elucidativo: respeito as figuras (nem poderia ser de outro modo), e não sou provinciano ao ponto de entender que só "nados e criados" podem fazer caminho nas respectivas circunscrições, mas a "importação" de facto (apesar dos laços que sempre conseguem estabelecer-se com as terras de recepção) das figuras de proa pode atestar ou a dormência cívica ou a "limpeza étnica".

Não se geraram líderes locais? Se sim, por que não assumem os focos de poder político social e político do Concelho? Se não, por que razão secou a fonte? Por que não entram nas sedes dos partidos, dos clubes e associações e por que não encimam projectos culturais que escapem à marginalidade do "alternativo" ou à facilidade do "pimba"?

Creio que poucos me subscreverão, mas acreditem, pelo menos, que escrevo sem ressentimento ou com outra pretensão que não seja a de tentar encetar um debate sobre a liderança que se foi perdendo, em Coimbra, como em tantas terras. Por cá, faz-me mais confusão, já que temos condições e mole humana para ser um pólo de excelência não apenas na Ciência, na Educação e nas profissões liberais – onde temos feito boa figura – mas também na vitalidade cívica e na influência política, que já tivemos.

Coimbra já deu ao País gente que pôde ser, com mérito, Primeiro-Ministro, Presidente da Assembleia da República, Ministro, e por aí fora… E agora?...

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