quinta-feira, 18 de abril de 2013

ESTADO LIBERTARIO OU ESTADO LIBERAL ?



Há tempos, fui dar um passeio até à bela cidade de Bruges, na Bélgica, o que me levou a atravessar uma região industrial francesa outrora florescente . Duas industrias reinavam nessa região : a têxtil e as minas de carvão. A primeira  é moribunda, a outra trespassou !
Ao passar pela auto-estrada Lille-Roubaix-Tourcoing ,que perdeu mais 2000 empregos recentemente, não pude deixar de pensar no drama do nosso Vale do Ave.
As portas da fiação Cavrois-Mahieu, à Roubaix (Nord) fecharam. Ultima fábrica de lanifícios,  que não pôde evitar a liquidação judiciária.
Aqueles  que aí tinham trabalhado durante dezenas de anos, deixaram a fábrica, em lágrimas, conscientes, que a vida profissional tinha acabado. Os mais jovens pensam desde já na reconversão, arriscada em tempos de crise, porque não é todos os dias que vem uma Toyota , como em Valenciennes, implantar-se na região.
Uma parte da historia desta região, construída sobre a industria têxtil apagou-se assim, tristemente.
Como foi possível chegar a esta situação ?
Globalização, deslocalisaçoees, concorrência desleal e selvagem dos países asiáticos, que não jogam com as mesmas cartas, cumplicidade dos nossos políticos e esta Europa sem fronteiras.
Mas, antes de tudo : o exemplo absoluto de um desastre provocado por um sistema económico mundial , não administrado.
O Estado liberal postula que a livre empresa é fonte de progresso. Estamos num mundo de concorrência política e social. Os melhores homens chegam aos melhores postos. As melhores empresas dominam o mercado. Os melhores pesquisadores são honrados e premiados. Os melhores correctores da bolsa são recompensados. Quanto aos outros, estes conservam o seu lugar entre o fundo e a superfície, em função dos seus esforços e dos seus méritos .
Esta organização social postula, para fazer crer que ela não é injusta, que todos os homens nascem livres e iguais e que eles arrancam todos da mesma linha de partida. Este postulado é , de imediato, falso, porque admite que alguns podem ser mais empreendedores que outros, ou fazem melhores esforços.
E somos obrigados de admitir que os mais dotados o são por natureza ou por herança, o que falseia de imediato a competição, porque é evidente que toda a gente não parte do mesmo ponto . Assim,  podemos contentar-nos de dizer que todos os homens nascem livres e iguais em direitos, mas em direitos somente.
A competição é a marca mais discutível do ambiente liberal. A competição supõe que há vencedores e vencidos e coloca estes últimos sob a dependência do bem querer, senão da caridade, dos primeiros. De qualquer maneira, o liberalismo não visa a igualdade. Ele visa uma sociedade economicamente produtiva e hierarquizada.
 Esta hierarquia pode ter várias facetas: No XIX ° século, as dinastias dos “mestres de forja” ( assim se chamavam as siderurgias , que o meu passeio através desta região sinistrada  trouxe à minha memória) , apropriaram-se do meio de produção.  Dispunham do poder de dar trabalho, o pão e um alojamento, alienando o trabalhador, dependente, portanto, do “mestre de forja” ! Perder o seu trabalho, era perder tudo.
Estes industriais enriqueciam-se, mas também criavam trabalho. Por vezes, um miserável trabalho, mas trabalho mesmo assim.
Mais tarde, veio o ultra-liberalismo, o capitalismo financeiro, sem projecto de sociedade, sem lei.  E tudo mudou : poucos empregos, poucos salários, pouca distribuição de riquezas e capitalistas invisíveis!
O Estado liberal não defende o povo,  por definição. No máximo, é forçado a legislar para impedir os abusos mais visíveis e imorais : trabalho das crianças, férias pagas , duração legal do trabalho, nem sempre respeitadas, cedendo pouco a pouco, contra vontade, sob a pressão dos movimentos sociais.
Incapaz de impedir o desemprego e a miséria social, o Estado ultra-liberal não protege o trabalhador. Está de conivência com os que possuem a riqueza das nações.
A miséria que assola Portugal, e não só, demonstra a falência dum sistema , que alguns procuram ainda salvar,  mudando os homens do sistema , quando é este que é imperioso de destruir.
J. de Freitas Pereira

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