Não é kafkiano, mas casapiano, o processo que marcou indelevelmente a nossa sociedade e que tudo leva a crer que, oito anos volvidos, ainda não tem fim à vista, apesar do significativo avanço que hoje se aguarda. O seu impacto deve-se sobretudo ao conjugar de dois factores: crime hediondo e repugnante (presumivelmente) praticado por figuras de relevo social. A fórmula não é de hoje, nem se restringe às nossas fronteiras, mas por cá despontou um interesse nos media como nunca antes tínhamos assistido.
Se por um lado esse interesse se traduziu em coragem - a dos órgãos de comunicação social que denunciaram o caso -, por outro, esse mérito foi ligeiramente ‘apagado’ pela sede dos que preteriram noticiar os factos a explorar, sem dó nem piedade, os aspectos puramente emocionais, causando profunda comoção na opinião pública.
Ora, se é certo que a denúncia pública é o papel essencial da comunicação social, certo é também que a ela não deve estar associada uma atitude sensacionalista, que adultere o bom serviço público até aí prestado. Porém, o processo Casa Pia não escapou a isso. Nunca antes a justiça portuguesa se vira transformada num reality-show, metáfora que alguns oportunamente usaram. Nunca antes se vira tantas conferências de imprensa improvisadas à porta dos tribunais. Nunca antes se assistira a tanta crítica ao modus operandi dos nossos tribunais, pondo em causa actuações e decisões.
“Quais são os melhores espectáculos contemporâneos, desportivos à parte?” questionou o jornalista francês Alain Minc. O próprio encontrou a infeliz resposta: “As grandes comoções colectivas? Não foram nem o genocídio ruandês, nem a guerra na Bósnia, nem a criação do euro. Mas sim o fantasma pedófilo, que percorreu de um extremo ao outro o continente”.
Se por um lado esse interesse se traduziu em coragem - a dos órgãos de comunicação social que denunciaram o caso -, por outro, esse mérito foi ligeiramente ‘apagado’ pela sede dos que preteriram noticiar os factos a explorar, sem dó nem piedade, os aspectos puramente emocionais, causando profunda comoção na opinião pública.
Ora, se é certo que a denúncia pública é o papel essencial da comunicação social, certo é também que a ela não deve estar associada uma atitude sensacionalista, que adultere o bom serviço público até aí prestado. Porém, o processo Casa Pia não escapou a isso. Nunca antes a justiça portuguesa se vira transformada num reality-show, metáfora que alguns oportunamente usaram. Nunca antes se vira tantas conferências de imprensa improvisadas à porta dos tribunais. Nunca antes se assistira a tanta crítica ao modus operandi dos nossos tribunais, pondo em causa actuações e decisões.
“Quais são os melhores espectáculos contemporâneos, desportivos à parte?” questionou o jornalista francês Alain Minc. O próprio encontrou a infeliz resposta: “As grandes comoções colectivas? Não foram nem o genocídio ruandês, nem a guerra na Bósnia, nem a criação do euro. Mas sim o fantasma pedófilo, que percorreu de um extremo ao outro o continente”.
Note-se que este protagonismo e esta visibilidade social dos tribunais junto da opinião pública são relativamente recentes. Devem-se, sobretudo, ao chamados «novos tipos de criminalidade» com forte repercussão social e política, como é o caso da pedofilia mas também do crime económico organizado e da corrupção. Naturalmente que esse interesse intensifica-se consoante o grau de notoriedade dos cidadãos neles envolvidos.
E assim a justiça tomou de assalto as redacções e monopolizou os noticiários, o que se por um lado conduziu a uma maior consciência social dos portugueses, por outro, a avidez da comunicação social tem levado a que, com frequência, se excedam os limites da legalidade e da liberdade.
Mas é precisamente na base do desentendimento entre um poder constitucionalmente consagrado – o poder judicial – e um poder atípico, o chamado “quarto poder”, que se encontra a maior virtude deste processo. É que as opostas lógicas de funcionamento e os diferentes universos de regras, princípios e interesses ofereceram, e oferecem, matéria-prima bastante para que a justiça portuguesa repensasse questões como o segredo de justiça, prisão preventiva, as escutas telefónicas, a competência e a habilidade dos defensores, entre muitas outras problemáticas, abrindo caminho a reformas legislativas.
Quanto à comunicação social, estou em crer que, no exercício da sua actividade, tem agora uma percepção mais nítida e rigorosa da fronteira entre a liberdade de imprensa e o, não menos fundamental, interesse punitivo do Estado e da eficácia da investigação criminal.
Mas é precisamente na base do desentendimento entre um poder constitucionalmente consagrado – o poder judicial – e um poder atípico, o chamado “quarto poder”, que se encontra a maior virtude deste processo. É que as opostas lógicas de funcionamento e os diferentes universos de regras, princípios e interesses ofereceram, e oferecem, matéria-prima bastante para que a justiça portuguesa repensasse questões como o segredo de justiça, prisão preventiva, as escutas telefónicas, a competência e a habilidade dos defensores, entre muitas outras problemáticas, abrindo caminho a reformas legislativas.
Quanto à comunicação social, estou em crer que, no exercício da sua actividade, tem agora uma percepção mais nítida e rigorosa da fronteira entre a liberdade de imprensa e o, não menos fundamental, interesse punitivo do Estado e da eficácia da investigação criminal.
Independentemente do desfecho deste processo, uma coisa é certa: ele definiu um antes e um depois na justiça e na sociedade portuguesa.
*Foto da revista Visão
2 comentários:
Talvez não fosse má ideia dar nota ao Sr. Carlos Cruz que a presunção de inocência já acabou, que devia perder o seu tempo e energia no recurso, porque nenhum telespectador pode ajuda-lo...
Só me pergunto por que é que Carlos Cruz se acha tão interessante para ser vítima de uma orquestração...
Se foi assim, porquê ele e não Julio Isidro, Malato, Fernando Mendes, Marco Horácio ou outro?!
Não cumpre duvidar de um presumível inocente, mas não deixa de me falhar o elo lógico da defesa.
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