segunda-feira, 4 de setembro de 2006

Fala quem sabe

Da "globoesfericamente" famosa Universidade de Verão do PSD retive, entre outras coisas, a interessante palestra de Miguel Monjardino que, como era de esperar, incidiu muito sobre o estado de coisas no Médio Oriente. Citando de cor e sem o mesmo engenho, há pontos que me parecem de ponderar:
  • ocorre, no Médio Oriente, a transição para líderes que exacerbam os sentimentos religiosos e que cada vez mais se comportarão como Ahmadinejad.
  • a religião será ponto determinante no choque de perspectivas (de civilizações, segundo Huntington), como provam, a contrario, os fracassos dos regimes laicos de base muçulmana (acrescento eu, a propósito, que a União Europeia devia gerir com pinças e urgência os casos da Bósnia-Herzegovina, da Albânia e da Turquia).
  • o Líbano, sendo um caso claro de actuação procuração de milícias extremistas, não terá paz a breve trecho, ficando por perceber os custos que as opiniões públicas europeias aceitam pagar (poucos, digo eu) por um protagonismo diplomático não muito lógico, na óptica muitos eleitores. Lembre-se ainda que o ocaso da influência predominante da geopolítica europeia se deu, em meados do século XX, não muito longe, no Canal de Suez.
  • o Irão e, sobretudo, o Paquistão (a chave do que se passa no Afeganistão, por exemplo) são os grandes problemas, no imediato. A lembrar que o segundo já tem armas nucleares e tem muito mais instabilidade interna do que a antiga Pérsia.
  • os Estados islâmicos (para evitar reportar-me à própria civilização), nas últimas décadas, não produziram uma só inovação (científica, cultural ou outra) de relevo para o futuro da humanidade. Relembro que, no passado, das partidas muçulmanas do globo vieram incontáveis avanços.
  • o Médio Oriente vai dar-nos muitas e grandes dores de cabeça, nos anos vindouros.

Se bem sumariei e adornei, há sempre que destacar os actores sociais que realmente acrescentam à nossa capacidade de perspectiva ou, pelo menos, de prospectiva. Miguel Monjardino é um desses casos; oxalá alguma força política consiga persuadi-lo a emprestar o seu saber à administração da res publica.

Com a endogamia partidária actual, confesso-me céptico.

3 comentários:

Luis Cirilo disse...

Optimismo meu caro Gonçalo,porque agora vamos "Pensar em Grande".
(Pausa para um incontrolável ataque de riso...)
Por mim já penso assim há muito tempo e ,no Congresso de Pombal, estivemos quase a chegar lá.
Porque,diz o povo na sua imensa sabedoria que "Fraco Rei (e cortesãos acrescento eu)fazem fraca forte gente".
E a nossa gente é,e tem de continuar a ser,forte.
Muito Forte

O Politicopata disse...

Endogamia é bom....

Gonçalo Capitão disse...

Para quem goste do tema, deixo a versão "maxi" deste post:

Há algum tempo que venho, na medida das minhas capacidades, pensando um pouco sobre o que se passa no Médio Oriente, a propósito do que se vai passando no Líbano.

Confesso que sistematizei as notas, depois de, na Universidade de Verão do PSD, ter ouvido a interessante palestra de Miguel Monjardino que, como era de esperar, incidiu muito sobre o estado de coisas naquela região.

Assim, começando pelos novos protagonistas, ocorre, no Médio Oriente, a transição para líderes que exacerbam os sentimentos religiosos e que cada vez mais se comportarão como Ahmadinejad. Além do ditador iraniano, nomes como o de Bashar al-Assad (Presidente da Síria), aqui mais por tolerância do que por instigação, vão preencher páginas dos jornais ocidentais durante muitos e bons anos. Isto, claro está, enquanto a onda de radicalização não alastrar, levando à queda sucessiva de regimes mais moderados (no sentido religioso do termo), como Mubarak, no Egipto; veja-se, por exemplo, a maior moderação de tom pró-ocidental que exibe o actual soberano jordano, Abdullah II, quando comparado com o do seu pai, Hussein.

A religião será ponto determinante no choque de perspectivas (de civilizações, segundo Huntington), como provam, a contrario, os fracassos dos regimes laicos de base muçulmana. Acrescento, a este propósito, que a União Europeia devia gerir com pinças e urgência os casos da Bósnia-Herzegovina, da Albânia e da Turquia: no primeiro caso, porque é a única esperança de paz; no segundo, porque não é possível ou recomendável construir uma fortaleza estanque ao redor de um Estado já de si caótico. Já no último caso, urge uma qualquer decisão (seja ela qual for), sendo certo que uma nega dará queda do regime constitucional laico (mantido com muito “trabalhinho” das forças armadas turcas).

Infelizmente, a interpretação da fé islâmica propugnada pelos novos tiranos, já o sabemos, pouco tem a ver com a essência do Corão, sendo utilizada como forma de instrumentalizar povos deliberadamente mantidos na ignorância. Que o digam as mulheres…

Mais concretamente, o Líbano, sendo um caso claro de actuação procuração de milícias extremistas, não terá paz a breve trecho, como não teve em décadas. Só uma autoridade estatal incontestada e uma imunidade à convulsão dos países circundantes (algo que não se antevê como possível) permitiria sossegar o País do Cedro, ficando, todavia, por perceber os custos que as opiniões públicas europeias aceitam pagar (poucos, digo eu) por um protagonismo diplomático não muito lógico, na óptica muitos eleitores. Hoje em dia, embora se sintam obrigadas a impor uma certa cartilha de direitos humanos (a correcta, digo eu) e a competir entre si pela influência geo-estratégica (designadamente, EUA vs. UE), as nações ocidentais começam a conhecer as chamadas guerras de baixa intensidade (precisamente as que se travam contra movimentos terroristas, como o Partido de Deus, vulgo Hezbollah), que não se vencem com facilidade ou de todo, e fixam limites de curta duração e baixas muito reduzidas como limiar de aprovação pelo tribunal da opinião pública (algo a que não se sujeitam os terroristas e os ditadores islâmicos que os patrocinam).

Lembre-se ainda que o ocaso da influência predominante da geopolítica europeia se deu, em meados do século XX, não muito longe, no Canal de Suez. A zona não traz, portanto, boas memórias.

No curto prazo, precisemos a análise, o Irão e, sobretudo, o Paquistão (a chave do que se passa no Afeganistão, por exemplo) são os grandes problemas, no imediato. A lembrar que o segundo já tem armas nucleares e tem muito mais instabilidade interna do que a antiga Pérsia. De facto, o país liderado com mão-de-ferro (laica, pese embora) pelo general Pervez Musharraf é um caldeirão prestes a transbordar, podendo, a qualquer momento, perder o tom pró-americano e converter-se, enquanto o diabo esfrega um olho, num alfobre de terroristas e extremistas religiosos. Se virmos bem, muito do que se passa na Europa ou em outras Nações da zona oriental do globo tem inspiração no país que Jinnah fundou.

A verdade (pelo menos é algo em que acredito) é que os países ocidentais estão excessivamente tolhidos pelo elevado grau de sofisticação dos seus direitos, liberdades e garantias adquiriram, encontrando-se impedidos de reconhecer e impor a sua superioridade ética. Para não melindrar quem quer que seja e não ser apelidado de islamofóbico basta lembrar, seguindo Miguel Monjardino, que os Estados islâmicos (para evitar reportar-me à própria civilização), nas últimas décadas, não produziram uma só inovação (científica, cultural ou outra) de relevo para o futuro da humanidade. Para se perceber o relevo do lembrete, sublinho apenas que, no passado, das partidas muçulmanas do globo vieram incontáveis avanços.

Em suma, o caso é complexo e pergunto-me se os portugueses foram devidamente informados pelos seus políticos ou se, o que me parece mais provável, confiam na boa estrela dos seus militares e na circunstância real de estes, nas missões externas, raramente estarem na primeira linha de combates (algo que não é culpa sua ou dos nossos governos, mas sim da dimensão real do nosso País).