segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Donald não é pato

Com as evidentes e importantes distâncias, vejo os protestos madrugadores contra a posse de Donald Trump quase como vejo a resistência dos taxistas à Uber: a prazo, vale o mesmo que espetar o dedo numa fenda de uma barragem.

Diria mesmo que as proezas do Presidente norte-americano apenas foram espoletadas, já que, depois de telefonemas de Taiwan e para Moscovo, e de revogações de tudo e mais umas botas, conseguiu mesmo, segundo fontes lidas, fazer tremer uma certeza que tinha como bíblica, virando Maria Vieira contra Ana Bola.

Brincadeiras à parte, a verdade é que existe um ponto de vista analítico de que devemos partir: Trump ganhou as eleições, competindo a quem deseje demonstrar o contrário (estribado em interferências russas ou outras acusações). E nem vale a pena repetir as lamúrias sobre os (muitos) votos a mais que teve Hillary. O sistema eleitoral não pode ser um exemplo democrático quando ganham os favoritos dos artistas e jornalistas, e uma maquinação demoníaca quando vence o patinho feio (neste caso, o Donald).

Não quero, com o que já vai dito, que fique a ideia de que subestimo o que temos em mãos. Desamparar os mais desfavorecidos nos EUA pode gerar convulsão num país que necessitamos de ter estável e atento ao mundo. Por falar nele, “America first” significa que o nosso irmão maior vai deixar de nos defender nas bulhas que vêm por aí e que se antevêem cada vez mais perigosas. Por seu turno, impedir a circulação de muçulmanos em modo lato apenas lançará fermento de ódio em massas já inclinadas a acreditar em patranhas que incitam à violência contra o “outro”, só porque é outro. Um muro, qualquer que ele seja, divide e aumenta ressentimentos. E por aí fora…

Porém, voltamos à mesma: a constituição americana permite tudo isto? Parece que sim.

Este Donald, assim, é todo menos pato e, escorado por uma péssima escolha de opositor por parte do Partido Democrata, limitou-se a cavalgar os medos que assolam as sociedades contemporâneas, muitos dos quais causadas por predadores económicos como ele próprio, os quais, sem preocupação com uma redistribuição mais justa da riqueza, foram subjugando milhões aos vendedores de falsas esperanças.

Talvez resida neste momento o despertar de uma Europa balofa e frouxa que achou que a invasão da Ucrânia e o Brexit eram culpa exclusiva de, respectivamente, russos e ingleses (os britânicos mais ansiosos por sair da UE). Já era tempo de os franceses pararem de pensar que são a Luz, de os alemães entenderem que economias sãs hão-de resolver todos os problemas, de os portugueses se fiarem nos brandos costumes para passar entre os pingos da chuva, etc, etc… E, já agora, também vinha a calhar que os comissários, eurodeputados e milhares de burocratas que sustentamos a pão-de-ló acabassem com discursos redondos para justificar as sinecuras, passando a uma retórica substanciada, motivadora e que responda aos problemas reais; os mesmos para os quais buscaram respostas os eleitores de Trump…

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