terça-feira, 26 de novembro de 2013

Assim como quem não quer a coisa…


…vos digo, sem referir-me a qualquer nação em concreto, que cada vez menos acho realista uma sociedade comunista.

Dito isto, reafirmo o que sempre disse e que aprendi com um de meus mestres (da Universidade e do partido): entendo que há ideais do comunismo que permanecem válidos. Creio ademais que o mundo seria um sítio melhor se não fosse utópica a construção marxista. Todavia, o leninismo e maoísmo provaram à saciedade que o filósofo se esquecera de uma pequenina variável que faz o projecto social entrar em modo de suicídio: o ser humano, com a sua imprevisibilidade, o seu anseio de liberdade – fora das baias de qualquer materialismo dialéctico – a sua inteligência e até mesmo a não subestimável estupidez humana (lição de outro mestre, este de Lisboa).

Reconheço que nada disto acrescenta algo ao que já disse vezes sem conta. O prego que, na minha mente, faltava ao féretro onde deixo jazer o comunismo é dado pelas novas tecnologias.

Continuando a omitir referências a qualquer caso concreto, dei comigo a pensar por que não – a mais da objecção primeira – haveria um projecto colectivista de resultar no século corrente. Pois bem; partamos de um cenário hipotético de um país industrializado, no qual os centros urbanos concentram o grosso da coluna de uma população proletarizada ou dedicada ao chamado sector dos serviços.

Imagine-se que, em seguida, começa a “clássica” reforma agrária e que se colectivizam as terras. Tenho para mim que até meados do século transacto poderiam “convidar-se” compulsivamente franjas da sociedade a trabalhar as terras “de todos”, que mais não fosse, deslocando força braçal de lugares remotos para os campos a cultivar (imagino que ainda haja quem acredite que não foi assim…). Deste modo, a coisa lá ia correndo mais ou menos (mais para menos, diria, passando o jogo de palavras), sem grande consciência geral, sem muita margem para contestação dos “alegres” agricultores e, sobretudo, sem informação sobre “outras vidas”…

Tentar um projecto agrícola colectivista nos dias de hoje seria remotamente possível (embora por aproximação, como na lotaria) num país com tecnologia de ponta em qualidade e quantidade suficientes. Talvez nos países de primeiríssima linha; ou seja, precisamente os que se não metem nessas andanças.

De outro modo, com a transformação das sociedades – designadamente com o seu cosmopolitismo generalizado – sem a possibilidade de usar os meios repressivos de outrora (com a excepção de Estados párias como a Coreia do Norte), e sobretudo com uma organização que já não se compadece com a cadeia de mando vertical, antes se organizando em rede(s), está condenada ao fracasso essa utopia, por exemplo, no caso destacado.

Hoje em dia, a Internet e os canais transmitidos por satélite permitem, se outros meios de informação livres não houver, ver o que se passa “lá fora” e exigir padrões de autodeterminação adequados ao contexto nacional vivido.

sábado, 9 de novembro de 2013

Como ilustrar uma notícia


«Passos Coelho reúne na próxima semana com parceiros sociais», diz-nos o jornal i, via Agência Lusa. Parece que vai ser uma reunião animada. 

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Uma descarrilada e bárbara novela

Esperei, esperei e esperei… Li, li e li… Escutei, escutei e escutei… E, por pouco, não vomitei, vomitei e vomitei…
A história que envolve o divórcio de Manuel Maria Carrilho e Bárbara Guimarães já motivou dezenas de reportagens vampirescas, centenas de crónicas presunçosas e milhares de piadas de hilaridade variável.
Pois bem: não podendo vencê-los, junto-me a eles, procurando um ângulo pessoal, depois de deixar a questão marinar e, praticamente, sair da agenda.
Assim e em primeiro lugar, devo dizer que sou um fanático da privacidade. Ora, sobre o caso que hoje nos ocupa, a vertente “nacionalizadora” desta íntima propriedade privada tem três perspectivas que vale a pena explorar: por um lado, o meu eventual pesar é amplamente diminuído pelo facto de terem sido os próprios visados a aproveitar o lado cor-de-rosa da mediatização. Enquanto as reportagens foram elogiosas e peças de um puzzle que compunha a imagem de uma família de sonho, não se ouviu murmúrio de pranto ou cautela (antecipadas desculpas se me equivoco).
Por outro lado, foram os órgãos de comunicação social que criaram o “monstro”. Manuel Maria Carrilho mais não é que uma personagem cuja voz foi amplificada por media sequiosos de uma audiência que, cada vez mais, se alimenta de emoção e não de informação. Eram os enxovalhos a outros políticos (relembro as nojentas referências a um momento passado que o, então, ministro Morais Sarmento corajosa e aprioristicamente assumira), as crónicas e intervenções que denegriam quem lhe dava palco (foi com base numa delas que pude contrariar num debate o seu correligionário Augusto Santos Silva), os textos a construir uma imagem de intelectualidade, mesmo que, aposto, quem lhe desse projecção não entendesse uma vírgula (e logo não conhecesse o mérito académico daquilo que lia) da sua obra filosófica, e todo um percurso de candidaturas e nomeações comodamente toleradas em homenagem ao manancial de notícias que sempre se esperaram de Carrilho…
Por fim, importa reconhecer, a contrario e embora mantenha o que vai dito supra, que tratando-se de duas figuras que desempenham tarefas de alta exposição e possuem perfis de alto coturno, parte da publicidade do caso não deve espantar ou motivar crónicas moralistas.
Creio, em suma e não entrando nas entranhas de um caso que fede por si só, que podemos nele sublinhar dois erros de tomo: em primeiro lugar, o de Carrilho que, por muito que pudesse ter algum capital de queixa, já converteu Bárbara em mártir (se calhar, merecidamente). Em segundo lugar, o da jornalista do Correio da Manhã (e/ou da sua televisão) que tinha o dever ético de recusar a pergunta sobre as tentativas de violação alegadamente perpetradas pelo padrasto daquela, ainda que tal pudesse ter consequências profissionais; há barreiras de humanidade que não se cruzam.