Muitos são
aqueles que descobrem, há uns meses para cá, o impacto mortífero do
imperialismo financeiro sobre a vida dos cidadãos de todos os países.
Até aqui,
falava-se do capitalismo, como poder económico do qual dependia o nível de vida
dos povos, segundo o bom prazer dos que possuíam este poder. Enquanto este
distribuía algumas migalhas do imenso bolo, que os outros produziam, as coisas
lá iam mais ou menos, e antes menos que mais, sem choques violentos, porque era
necessário, por um lado, manter em "vida" os obreiros do bolo, na paz
e no sossego que convinha aos que possuíam tudo, e que, por outro lado, os que
recebiam as migalhas contentavam-se do pouco porque nem sabiam que tinham
direito a mais. O emprego existia, a miséria era contida dentro dos limites do
terço mundo. Todos pareciam satisfeitos da vida, excepto para aqueles que
tinham ousado ir ver mais longe e que não voltaram mais.
E isto assim
foi durante décadas, até que a marcha do mundo se acelerou. A invenção perniciosa
do capitalismo, a do crédito fácil para todos, já e agora, permitiu a expansão
do MERCADO e, com ele, a explosão das dívidas: a dos particulares e a do
Estado. Os particulares, a quem os promotores do GRANDE BOLO prometiam fatias
mais suculentas e variadas, do automóvel à casa, do passeio ao estrangeiro às
férias a crédito, tudo o que se sonhava era transformado, como por encanto, em
realidade!
A dívida do
Estado, a quem os autores do grande MERCADO prometiam rendas fiscais
extraordinárias, porque, diziam eles, com o pleno emprego, quanto mais se
consome mais taxas se pagam, isto é, os produtores e os consumidores, as rendas
e os salários, sem falar das benesses de vária ordem de que os políticos iriam
beneficiar (e nas quais estes se fartaram até à indigestão!) se as leis
conviessem ao grande MERCADO.
Os boys da
escola de Chicago, os apóstolos do MERCADO auto regulável, tinham ganho a
partida Como se a ganância, a cupidez e o ... apetite e as necessidades ainda
não satisfeitas, podiam auto regular-se!
Entretanto,
novos actores apareceram, entre os quais os países ditos emergentes, saídos da
letargia e do colonialismo, que mais não eram que imensos reservatórios de
forças humanas desocupadas, prontas a servirem em não importa quais condições,
mesmo esclavagistas, desde que os arrancassem à vida miserável na qual
vegetavam. Por muito pouco que lhes dessem, em troca de trabalho sem conta, era
sempre melhor que o nada com que sobreviviam.
Foi o caso
dos dois grandes reservatórios da Índia e da China, e de todos os países
asiáticos.
A emergência
da filosofia dos dois sistemas, capitalista e comunista, no mesmo regime
político, inaugurada por Deng Chiao Ping, na China, foi o sinal da mais
formidável corrida ao lucro fácil na qual o capitalismo mundial sonhava desde
há muito, de facto desde os primeiros passos da industrialização dos dois
últimos séculos.
Escapar às
leis impostas pela democracia e à decência do tratamento devido àqueles que
trabalham, era exactamente o que desejava a ganância mórbida dos detentores de
capitais, sequiosos de rentabilidade financeira, de dividendos e bónus chorudos
para os accionistas.
Ah, que
grandes países estes onde não existiam sindicatos para combater a exploração
desenfreada e onde o regime político envia os carros de assalto contra aqueles
que reclamam os direitos humanos mais elementares.
Esta abertura
sobre um mundo do trabalho, vasto e inesgotável, iria fornecer aos detentores
de capitais um poder extraordinário que, pela sua dimensão, vai pôr em cheque o
poder mesmo dos Estados. Adeus o pleno emprego, as fatias do GRANDE BOLO de
outrora, as rendas fiscais e a paz social. O GRANDE BOLO será confeccionado
fora das fronteiras, o resultado aferrolhado nos paraísos fiscais, fora do
alcance do Estado, que deverá "inventar" o dinheiro para sobreviver
ele mesmo.
Assim
reflectia, quando, na semana passada, em França, um gigante do aço, a sociedade
Mittal, liderada por um Indiano, conseguiu impor a sua lei ao Estado Francês,
ordenando o encerramento duma grande siderúrgica, a sociedade Arcelor, na
Lorraine, outrora grande fornecedor da industria automóvel, adquirida aquando
duma O.P.A. (oferta pública de compra) na bolsa.
O problema é
que esta firma indiana possui dois terços do mercado do aço mundial, e que,
tendo adquirido a firma francesa e encerrando-a agora, eliminou desta maneira
um concorrente, e beneficiou assim as outras firmas do mesmo grupo que produzem
o mesmo aço a preços mais reduzidos, graças aos salários mais baixos praticados
em países mais "competitivos" ! Isto é, onde se trabalha por menos! O
quase monopólio do aço permitiu-lhe agir assim, e o Estado Francês nada pôde
para o evitar, porque assim vai a lei do comércio internacional e a lei do
MERCADO!
Este é o
grande problema dos monopólios, autênticos Estados dentro dos Estados, fenómeno
recente da economia capitalista.
O monopólio é
um produto da concentração da produção a um nível muito elevado que pode tomar
a forma de cartéis, trusts ou sindicatos patronais da indústria. Fundidos com
grandes bancos, constituem o capitalismo financeiro, interpenetração do capital
industrial e do capital bancário. Ora, como vimos no caso que citei da firma
francesa, a criação de monopólios visa a substituir-se à livre concorrência. E
na realidade, não é só na indústria: existe o caso da Monsanto americana, quase
monopólio mundial das sementes ou ainda certos laboratórios farmacêuticos.
A
predominância do capital bancário faz com que uma parte cada vez mais
importante do capital industrial não pertença aos industriais mas aos bancos
que são os verdadeiros proprietários.
De
intermediários nos pagamentos, os bancos converteram-se em fornecedores
essenciais do capital. E a vergonha suprema é quando após terem jogado com o
nosso dinheiro no casino dos "hedge funds" vêm pedir aos
contribuintes para os salvarem da falência!
Mesmo se, à
primeira vista, parece não ter nada a ver com o que precede, esta história do
monopólio, levou-me a reler certos aspectos da nossa história colonial, que
também teve noutros tempos os seus monopólios. E, à passagem, os investimentos/
aquisições que certos antigos colonizados fazem actualmente em Portugal.
Na partilha
territorial do planeta entre as grandes potências capitalistas no termo duma
colonização violenta da África e da Ásia, a possessão das fontes de
matérias-primas foi uma das motivações maiores desta politica de agressão e de
dominação.
Ao mesmo
tempo, a acumulação de capital-dinheiro tinha atingido tais proporções nos
países "avançados" que estes, se esforçaram para exportar o excedente
em direcção aos países colonizados e dependentes afim de os rentabilizar.
Ontem, a CUF, empresa monopolística, e o Banco Nacional Ultramarino, entre outros,
proprietários de grandes territórios no ultramar, onde investiam, enquanto o
território metropolitano tanto carecia de investimentos e o povo vivia
pobremente.
E hoje, o
mesmo movimento, desta vez dos antigos colonizados, agora grandes capitalistas,
fazendo parte do cartel do petróleo e dos diamantes, que, pelas mesmas razões,
mas em sentido contrário, exportam capitais, enquanto lá em casa, milhões de
cidadãos sobrevivem em condições indignas. O que prova bem que o capitalismo,
ligado à ganância e à cupidez, é uma enfermidade que se apanha facilmente,
qualquer que seja a origem social dos doentes, mesmo saídos das revoluções.
O capital
financeiro cria uma "oligarquia financeira", insaciável e
mundializada, que consegue envolver todas as instituições económicas e
politicas, sem que a situação miserável e desesperada dos povos a preocupe.
Esta é a marca do capitalismo selvagem, que tem os seus servidores na
governação da Europa e na OMC (Organização Mundial do Comércio), e os seus
lacaios nos políticos dos Estados.
Freitas
Pereira
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