Acabo de ler o primeiro romance de Jorge Amado, escrito quando tinha 18 anos, publicado em 1931 e, infelizmente, ainda hoje muito actual. O País do Carnaval é um olhar, sem rodeios, sobre o Brasil e o seu povo. Um retrato de uma geração de brasileiros conformados, adormecidos, cuja única aspiração parece ser a velhice. A personagem principal, Paulo Rigger, saiu do Brasil para se formar em França e, uma vez de volta, bem procura o sentido da vida, da pátria, da terra. Porém, acaba sempre por esbarrar nos cépticos e cedo percebe que não é fácil escapar à «mediocridade perpétua em que a nação se encontra».
Jorge Amado não tem pudor em afirmar, no prefácio, que a obra tem um cenário triste: o Brasil, «natureza grandiosa que faz o homem de uma pequenez clássica». E é essa antítese que percorre todo o livro, a grandeza de um país que asfixia, quase esmaga, os seus pequenos homens. A certa altura, o autor chega a comparar a nação a uma mulata desconhecida:
«(…) é entre as suas coxas sadias
Que repousa o futuro da Pátria.
Daí sairá uma raça forte,
Triste,
Burra,
Indomável,
Mas profundamente grande,
Porque é grandemente natural,
Toda da sensualidade.
Por isso, cheirosa mulata
Do meu Brasil africano
(o Brasil é um pedaço d’África
Que imigrou para a América),
Nunca deixes de abrir as coxas
No instinto insatisfeito
Dos poetas pobres
E dos estudantes vagabundos,
Nessas noites mornas do Brasil,
Quando há muitas estrelas no céu
E muito desejo na terra.»
Haverá quem considere que tal metáfora ofende a moral brasileira. Eu considero que Jorge Amado quis, tão só, abanar a consciência dos seus pares. E não será despropositado considerar que ainda hoje, quase um século depois, o Brasil continua a precisar de uns «abanões». É que ainda há dias vimos as carnavalescas eleições que por lá tiveram lugar, onde até palhaços iletrados são eleitos deputados federais. «E fica-se vivendo a tragédia de fazer ironias», como bem escreveu o autor.
1 comentário:
Não esquecendo Romário e Bebeto, antigos campeões do mundo de futebol, que forem eleitos, respectivamente, deputados federal e estadual.
Mas não é esta a essência da democracia, o regime onde o pobre pode ser "tanto" como o rico? Percebo a objecção, mas o critério é ténue.
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