quarta-feira, 12 de novembro de 2008

O dia em que o Mundo se enganou

Indo eu em sentido contrário, espantam-se-me os olhos com a fila contínua de autocarros que avisto na auto-estrada… É sábado e há manifestação de professores…

Era, evidentemente, o prenúncio de uma manifestação que, na prática, deve ter deixado em casa apenas os professores doentes, idosos, os que acham que não adianta protestar e as docentes grávidas, já que, a avaliar pelo barómetro familiar, foram a esta manifestação professores que jamais haviam estado num protesto de massas e outros que até são activistas e eleitores do PS.

Dizem os nossos docentes que o processo que conduz à sua própria avaliação e, logo, à eventual progressão na carreira é burocrático, não deixa tempo para preparar aulas e ensinar e obriga mesmo a escolhas, quando se trata de ter tempo útil de vida familiar ou particular, em geral.

Insinua a Ministra da Educação que o que esta classe profissional não quer é ser avaliada e que quer progressão automática na carreira, como havia até agora.

No meio de tudo isto a incoerência do Governo torna-se escandalosa, já que o Secretário de Estado Adjunto, Jorge Pedreira, diz que os professores que boicotarem o processo não serão alvo de processo disciplinar. O que quero dizer é que, na sequência da inflexibilidade da Ministra que admite limar arestas, mas não suspender o processo, entendo que até o mais contestatário dos lentes esperaria ver cair a guilhotina da 5 de Outubro; temos um Ministério de meias-tintas: não cede, mas também não tem coragem para impor o rumo.

E, se calhar, é melhor assim, mesmo que a equipa governativa dê um ar frouxo… É que, para disparate já basta o que está. Foram precisos anos para eu concordar com a Professora Ana Benavente, ex-Secretária de Estado, mas a realidade é que se combina o ridículo facilitismo da avaliação dos alunos (feita para enganar os números de Bruxelas) com uma burocracia, no caso da avaliação dos professores, que faria chorar de saudade os que ainda lamentam, em Moscovo, o fim da União Soviética.

Sejamos claros, todavia: eu (e creio que a maioria dos professores me acompanhará) acho que os docentes têm que ser avaliados, através de um sistema que premeie o mérito e faça progredir os que ensinem melhor e formem melhores cidadãos. Sei também que os sindicatos acham sempre que têm toda a razão (ainda para mais quando se intromete o impagável Mário Nogueira, agora em altas funções de protesto profissionalizado), mas duas certezas conservo: por um lado, os professores que ainda têm motivação e bases para isso devem, prestando contas pelo seu desempenho, poder ensinar, o que é, no fundo, o cerne da sua actividade.

A segundo ideia que tenho por verdadeira é a de que dificilmente três ou quatro governantes estão totalmente certos, quando têm cento e vinte mil eleitores a contestá-los… Como diria o Eng. Guterres: “é fazer as contas”…


Fotografia "emprestada" pelo IOL

3 comentários:

Joao Perdigão disse...

Olá Gonçalo

Inicio o meu post por agradecer a atenção que, pela segunda vez em tão pouco tempo, é dada aos professores no teu blog.

Sou professor há onze anos e não me recordo de ver tanto “papel” e desmotivação como agora...

Este (novo) sistema de avaliação está feito para premiar quem é melhor a fazer papéis e a “lamber botas” (mesmo que seja uma nulidade como professor…).

O problema da avaliação é apenas a “ponta do iceberg” e aquele ao qual se dá mais importância na comunicação social (talvez para vender jornais!).

E o novo estatuto do aluno?

E o novo sistema de gestão das escolas?

E o Dec. Lei 3/2008 de 7 de Janeiro e respectiva CIF? – alunos com necessidades educativas especiais.

E a "facilidade" dos exames nacionais?

E a inexistência de formação específica (para professores) nos centros de formação?

E a falta de condições de trabalho?

Etc, etc….

Afinal não estamos apenas a falar em avaliação!

Dizer que os professores nunca foram avaliados é fugir à verdade! Sempre fomos avaliados (relatórios críticos de progressão de carreira + avaliação dos mesmos por uma comissão avaliadora constituída por elementos do conselho pedagógico e executivo); Aliás, todos os dias somos avaliados pelos nossos alunos (quando falam dos seus professores em casa), encarregados de educação (quando estão em contacto connosco), colegas (nos conselhos de turma), Inspectores da educação (quando supervisionam as escolas), conselho executivo, etc…

A avaliação sempre existiu (num outro modelo!); A ideia de avaliar professores não foi uma ideia iluminada dos socráticos!

Aproveito para informar que ao longo destes onze anos que lecciono fui, por diversas vezes, avaliado (a última vez foi quando me submeti à defesa de uma tese de mestrado em Astrofísica, embora de acordo com o novo ECD essa minha formação extra não “sirva para nada” em termos de progressão na carreira…). E depois ainda vem para a televisão chilrear sobre o mérito...

Trabalhar com pessoas (alunos) não é o mesmo que fazer chaves ou montar carros…

Estive nas duas manifestações e sou daquelas pessoas que advogam que há outros canais para resolver os problemas – com esta ministra (autista) é difícil ir por esses canais…

Mas não há ninguém que tenha a lucidez de informar os portugueses que o futuro do país está a ser pintado a preto e branco..

Luis Melo disse...

De facto é vergonhoso.

Não entendo o que este governo quer, com o facilitismo que introduz na educação... Apenas para depois vir dizer que o sucesso escolar aumentou exponencialmente desde que o PS está no poder... E o futuro? Fica assim hipotecado.

Quanto aos professores, o Gonçalo diz muito bem, todos concordamos que devem ser avaliados. Mas essa avaliação não pode interferir na profissão deles, e muito menos obrigar a que se aprovem alunos...

Rui Miguel Ribeiro disse...

O mais espantoso é que o Governo força uma complicativa avaliação dos professores e deixa cair a avaliação dos alunos!!!
Por esta lógica, qualquwer dia somos nós que somos escolhidos pelos governantes em vez de os elegermos...