segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Pela boca morre o peixe (e o pescador...)

Nazaré, 1977

Este país já viveu da pesca e da agricultura e nesse tempo não havia assomos de vergonha por sermos grandes no sector primário, que se diz primário também porque é fundamental, porque é a base de qualquer economia. Contudo, nas últimas décadas viveu-se uma redução drástica da população nesse sector, com os portugueses a abandonarem as actividades primárias por um sem fim de motivos, sobretudo, a tosca ideia de que a modernização de um país se mede pela aposta nos investimentos em áreas ditas de ponta e não tanta na dedicação e fomento de ofícios ditos menores. Esta megalomania tem vindo a prejudicar-nos e os sucessivos governos pouco ou nada fazem para que se inverta a situação. Bem podem os pescadores fazer greve ou os agricultores juntarem-se em manifs, que o Ministério está-se bem nas tintas, conformados que estão com a ideia de que a pesca e a agricultura são os parentes pobres da economia nacional e nada por eles cumpre fazer.

No que respeita à pesca, numa recente reportagem televisiva pude ver como as gentes dela (sobre)vivem, tendo constatado um sector em declínio, onde os pescadores vendem o produto final de 36h de faina a preços miseráveis, sendo que a nós, consumidor, nos chega a preços exorbitantes. Enquanto na lota a sardinha se vendia a 80 cêntimos e, dividido o lucro, dava pouco mais que 5€ a cada um dos pescadores (alguns com 80 e muitos anos de vida), no mercado a sardinha vendia-se a 5€ e as famílias queixavam-se (e bem).

Regulação, fiscalização e reestruturação são coisas que não passam pela cabeça do Sr. Ministro que, nessa mesma reportagem surgia completamente a leste da realidade do país. Quando a jornalista o confrontou com o facto de 200 das 400 familias de pescadores da Caparica passarem fome nos dias de hoje, o Sr. Ministro insistiu em falar de fundos que por descuro nunca se chegam a ver - daí que lhe caia como uma luva a denominação de "Ministro da oportunidade perdida" que Paulo Portas lhe dedicou - e, inacreditável, teve a leviandade de sugerir que essas famílias recorressem a programas para apoio à abertura de negócios sazonais, estilo barracas de gelados e afins. Resumindo, o Sr. Ministro quer pôr gente que não tem que comer a investir..!

Igualmente chocante foi ver uma cadeia de hipermercados a reconhecer, sem qualquer pudor, que na altura dos Santos Populares comprou 150 toneladas de sardinhas a nuestros hermanos ao preço de 2 €/k porque, voilá, a Docapesca fechou nesses dias. É de facto surpreendente como estas coisas (não) funcionam neste país. Como um Ministro continua a mandar areia aos olhos dos portugueses, mostrando que desconhece por completo a situação que se vive no mar e nas lotas e menosprezando um sector que encontra neste país todas as condições naturais para poder ser uma referência a nível europeu. É vergonhoso que numa situação de crise se importem produtos de fora quando se poderia ser auto-sustentável em tanta coisa. E por fim, é ridículo que perante tamanha desgraça a única resposta eu um governo saiba dar passe por linhas de crédito.

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