quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Remodelação um acto de boa gestão


Tal como na economia em que as medidas de crescimento se devem tomar em períodos de recessão, também uma remodelação governamental, deve ser empreendida quando menos se espera e menos se fala dela.
Pois bem, mas a primeira pergunta é: Faz sentido uma remodelação nesta altura?
E as primeiras dúvidas surgem, será que não devia ser depois do veredicto do tribunal constitucional, mas vamos por partes.

Tenho a certeza de que seja ela qual for, refiro-me à decisão do tribunal constitucional, o governo tem alternativas já estudadas e prontas a implementar, pelo menos é o que nós esperamos, portanto, este não é de certeza um obstáculo.
Do outro lado, temos argumentos muito mais sólidos, tais como, uma execução orçamental que poderá ficar aquém do esperado, estamos a meio do mandato, portanto é normal alguns ajustes ao nível político, digo Ministerial. Parece-me consensual, que agora está na altura de medidas mais do lado do crescimento e emprego do que do lado da austeridade, porque o profundo combate ao desperdício ainda não foi bem-sucedido e por fim, porque António José Seguro e o PS andam à deriva, como se de um náufrago se tratasse.

É costume dizer, “que aquilo que nos trouxe até aqui, não nos levará mais longe”, mesmo em períodos de normal funcionamento das instituições democráticas, as rupturas também podem acontecer, como se de ciclos se tratassem, mesmo sem cairmos no desvario já antes ensaiado, de que os tempos difíceis já passaram.
Esqueçamos por momentos o plano de reduzir o défice do Estado em 4.000 milhões de euros e focalizemos-mos na economia real. A economia é acima de tudo uma gestão de expectativas e tendo em conta as últimas projecções pouco animadoras, duvido que haja alguém de bom senso que desate a investir e a criar emprego e é por isso, que tanto uma remodelação como alguma inflexão na trajectória são aconselháveis.

Não me atrevo a indicar quais seriam os Ministros remodeláveis, não só, porque ao contrário de alguns comentadores que falam sobre o que sabem e o que não sabem, esta remodelação deveria ter por base critérios muito objectivos para dar resposta a desafios muito concretos.
Eventualmente alguns dos Ministros remodeláveis até desempenharam o cargo de uma forma aceitável ou até exemplar, mas porque tinham uma missão quando tomaram posse, que hoje já não é a mesma e por isso deverão ser os visados. Repito, quando defenso uma inflexão no rumo, não quero dizer que os tempos difíceis já passaram, que o compromisso com a troika é para ser esquecido, ou até, que a consolidação orçamental está concluída, digo sim, que temos que tomar medidas para impulsionar a actividade económica, para dotar o mercado de alguma confiança a médio prazo, no fim para dar uma nova esperança aos Portugueses.

Que critérios deveriam então, estar na base da remodelação?
Atrevo-me assim a enumerar alguns:
- Ministros/Ministérios com rendimento aquém do esperado
- Ministros polémicos, não por terem tomado medidas impopulares e necessárias, mas porque carregam consigo uma carga negativa que contagia o governo todo
- Porque já cumpriram a missão que lhes foi pedida, dão sinais de cansaço e poucas soluções para o futuro
- Finalmente, porque têm que acreditar verdadeiramente que a solução passa por um novo rumo

Próximo passo, perfil dos escolhidos:
Credível, intocável, com peso político para tomar decisões difíceis, tenha ideias e se sinta identificado com a nova estratégia, com um novo rumo.

É escusado dizer, que aqueles que mais contribuíram para o descrédito do governo, não deverão ter qualquer influência na escolha dos novos responsáveis políticos, ou então teremos perdido mais uma oportunidade. Idealmente, a banca, a maçonaria, a opus-dei e outros grupos de interesse, não deverão também interferir nas escolhas, mas talvez ouvisse sigilosamente, o líder da UGT, da CIP, no fundo os principais players da concertação social. Agora sem Cândida Almeida, talvez seja possível começar a ter diálogos sigilosos.
Finalmente, como se comportaria a oposição… tal como tenho vindo a fazer, apenas abordarei a questão PS e António José Seguro porque o resto não me merece qualquer comentário.
AJS vive tempos difíceis, não só porque foi obrigado a reabilitar toda a tralha Socratista, mas porque da câmara Municipal de Lisboa chegou a principal oposição, António Costa. As reacções têm sido diversas, mas todas elas com um denominador comum, inócuas e básicas do ponto de vista do marketing político.

Sabemos à partida, que num cenário de remodelação, AJS dirá com certeza que o 1º Ministro é que devia ser o remodelado, que o Presidente Cavaco Silva devia convocar eleições antecipadas, bla, bla, bla…, a conversa do costume e que ontem João César das Neves tão bem descreveu quando se referiu a quem se opõe ao rumo seguido até agora. Dizia ele, que apesar dos enormes sacrifícios que tocam directamente muitas famílias Portuguesas, que o desbaratar dos recursos dos contribuintes foi de tal dimensão e durante tanto tempo, que está admirado como é que a factura não é muito mais elevada. Dizia também, que até hoje não viu, não leu e não ouviu nenhuma proposta alternativa credível, eu também não, apenas ouvi afirmações do tipo, "todos os caminhos menos este", ora isto é uma mão cheia de nada.
A liderança de AJS é por isso instável, a ausência de ideais credíveis e exequíveis são uma constante e a pressão interna condiciona a racionalidade do Secretário-Geral, levando-o a cometer disparates constantemente. Contudo e como é costume no nosso futebolês, quando uma equipa joga mal, não faltam treinadores de bancada a sugerir alterações de jogadores e de táctica, algumas, verdadeiras aberrações e outras com algum sentido mas pouco sólidas.

Há que reconhecer que nem tudo tem funcionado bem no governo e tal como nas empresas quando se cai num ciclo vicioso, há que tomar medidas, que normalmente passam por mudanças ao nível dos decisores. Neste caso, a remodelação para além de um acto de boa gestão, representaria a mudança para um novo ciclo, uma nova esperança para muitos Portugueses e quiçá o sinal que muitos empreendedores e investidores aguardam há tanto tempo.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Os Óscares, o Irão e a Política



Quem já esperava que o filme do ano, Argo, arrecadasse a estatueta dourada no passado domingo, esperava também que o Irão trataria de, mais tarde ou mais cedo, ripostar. Ontem mesmo o ministro da Cultura e Orientação Islâmica, Mohammad Hosseini, fez questão de vir dizer que Hollywood atacou a República Islâmica e que o filme em causa é «anti-iraniano» e carece de valor artístico.  

Não é de estranhar que assim pensem se tivermos em conta que o filme revela um Irão que se deixou cair, quase de forma patética, no genial e ardiloso plano montado por um agente da CIA, Tony Mendez, a fim de resgatar os seus compatriotas. Plano esse que passou precisamente pelo recurso à indústria cinematográfica de Hollywood, ao ficcionar a gravação de um filme em Teerão e incluir os próprios reféns no elenco e equipa técnica.

Embaraçoso, quanto muito. Mas não mais que isso - do filme não parece resultar qualquer ataque ao Irão. Ben Affleck, ao receber o prémio, agradeceu aos 'amigos no Irão', acrescentando que 'estão a viver tempos complicados', mas nada mais que isso. 

É certo que a revelação do Melhor Filme do ano foi dada em directo da Casa Branca, por Michelle Obama - cujo vestido foi criticado e alterado (ver foto acima) pela agência noticiosa Fars, dirigida pelos Guardas Revolucionários iranianos - e que a coincidência soou a reconhecimento político. Mas então o que dizer se o filme do ano fosse Zero Dark Thirty, que relata um dos momentos mais importantes da administração Obama, a captura de Bin Laden? Esse sim, seria um Óscar com inegável pendor político, ainda que o prémio pudesse ser merecido.  

Por fim, esta posição do Irão em acusar Hollywood de ser totalmente política faz ainda menos sentido se nos lembrarmos que há precisamente um ano atrás todo o Irão estava a rejubilar com o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, Uma Separação. Pela primeira vez na história dos Óscares, a Academia distinguiu um filme iraniano e não se deixou de levar por separações. A memória dos iranianos é curta, está visto.   

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Alvar

Sou daqueles que acha que há certo tipo de pessoas que, por serem de tão baixa igualha, não merecem qualquer espécie de menção. Um pouco a ideia de que há defuntos tão ruins que não merecem que com eles se gaste mais cera…

O leitor perceberá que me refiro ao treinador do Benfica, Jorge Jesus, para o qual abri uma excepção à regra supra mencionada, de tão alarve que é a criatura.

Antes porém de o fazer, duas notas preliminares: não confundo a instituição Sport Lisboa e Benfica com um ou outro energúmeno que a sirva.

Em segundo lugar, cumpre reconhecer que, no jogo de domingo, a Académica terá jogado um futebol pouco apelativo. Contudo, pego por aqui para escrever a tinta carregada o meu espanto, pois muitos dos que dizem que a Briosa estacionou um autocarro na Luz são os mesmo que acharam Alex Ferguson genial por ter jogadores deitados à frente da bola no jogo em Madrid, na semana passada, e que disseram que Mourinho era um mestre da táctica pela teia defensiva que esquissou quando, há alguns anos, o Inter de Milão dinamitou o ataque do Barcelona, no Nou Camp. E mesmo no caso dos que não apreciaram os mentores destes “estacionamentos de pesados de passageiros”, importa perguntar se queriam que a Académica desafiasse o poderoso SLB desta época, para sair de “blusa cheia” e com uma palmadinha nas costas dos jogadores por terem sido tão bons rapazes?!...

Jogou-se o que se pôde e, eu que não aprecio particularmente Pedro Emanuel, reconheço a inteligente preparação do jogo, olhando a jogadores proporcionados por uma gestão que já mereceu citação de exemplo de “fair-play financeiro” pela UEFA. Estou certo que com o passivo pantagruélico autorizado ao SLB a capacidade de luta seria maior, mas seria menor o orgulho do meu coração “negro”.

Dito isto, vem a prosa à guisa de Édinho (Briosa) ter dito que o ruminante indivíduo que conduz o SLB afirmara que a Briosa não “joga um c……” e que teria que descer de divisão.

Poderíamos encurtar razões, citando o eloquente prof. Manuel Machado: "um vintém é um vintém, um cretino é um cretino".

Porém, a boçalidade de J. Jesus merece mais comentário por ver um idiota que não consegue articular uma frase em português a falar da Associação Académica de Coimbra. Os termos em que o faz sublinham, aliás e fazendo fé no jogador da Briosa, os modos bestiais deste simulacro de cidadão.

Depois vem a questão ética. Um sujeito que, há não muito tempo, dizia que ordenara aos seus jogadores que não atirassem a bola para fora do relvado quando houvesse um adversário tombado e que “o fair-play é uma treta” (não falando sequer na ofensa que a todos faz com as suas idas ao cabeleireiro) não pode pôr em causa a deontologia de um adversário, apenas porque defendeu aguerridamente um nulo que só foi quebrado por um genial árbitro que discerniu qual dos jogadores se agarrava com mais força.

Em suma, há uma divisão à qual só o SLB vai descer: a da imbecilidade, enquanto por lá estiver Jorge Jesus.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Tirar o chapéu a...

Sou daqueles que, de há uns anos a esta parte, nem caio nas boas graças de Miguel Relvas. Creio, por isso, poder dizer com isenção que lhe louvo a resistência e, mais recentemente, o nível elevado com que tem enfrentado alguns momentos que oscilam entre o burlesco e o anti-democrático.

Falo, em primeiro lugar, na elegância com que respondeu às palavras de Francisco José Viegas sobre as facturas e os fiscais. Peço apenas que pensemos todos na escandaleira que os media armariam se fossem declarações de Relvas comentadas por Viegas. Assim, como este é intelectual, tem tudo muita graça...

Depois, falo dos imbecis com pretensões anarquistas que interromperam Relvas, no Clube dos Pensadores, cantando "Grândola, Vila Morena". Se queriam ser eficazes podiam, pelo menos, disfarçar as suas preferências pelo PCP ou pelo BE e evitar insultos (chamaram "fascista" ao Ministro). É tétrico pensar no projecto de sociedade de uma gente que impede debates democráticos e que ignora até o significado daquilo que diz (se Relvas fosse fascista, estariam a cantar num calabouço). Ainda assim, Miguel Relvas fez declarações tolerantes e democráticas.

Chapéu tirado!

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Falar depressa e sem paneleirices


Leio em alguma imprensa de hoje que PSD e CDS admitem discutir recuo na lei do aborto e do casamento gay!

Se isto for verdade, é prova que a mediocridade está instalada.

Que pouca vergonha, quanta ignorância... o país a saque, as pessoas sem dinheiro para se alimentarem em condições... e querem discutir paneleirices...

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Argo: um filme dentro de outro filme


O mais recente filme de Ben Affleck está nomeado para sete Óscares, mas já arrecadou - até ao momento - quarenta e sete prémios. Argo retrata uma questão diplomática ocorrida em 1979 no Irão pós-revolucionário, quando funcionários da Embaixada norte-americana foram feitos reféns por 444 dias. Excepção feita a um pequeno grupo que, graças à conivência de diplomatas canadianos e a um arriscado (e caricato) plano levado a cabo por um agente da CIA, conseguiu sair do país antes disso.

A missão bem sucedida deixou de estar sujeita a segredo em 1997 e Affleck aproveitou, e bem, para levá-la até ao grande ecrã. Tudo ali me parece exemplar, desde o trabalho cénico e de figurinos usado para nos transportar até ao final dos anos setenta, passando pelo cuidado na abordagem política, pelo intercalar de imagens de época e até no contrabalançar das questões sensíveis com laivos de humor.

De destacar que ali se faz um certo «ajuste de contas» pouco diplomático, pois dá-se a entender que se alguns diplomatas não hesitaram em cooperar, outros a isso se furtaram - ingleses e neozelandeses. Mal o filme estreou, a reacção desses diplomatas (de serviço em Teerão, à época) não se fez esperar. O diplomata britânico, hoje com 86 anos, considera injusta a forma como o filme leva o espectador a essa conclusão, até porque - segundo o próprio - ainda antes da colaboração canadiana, foi junto dele que os americanos encontraram abrigo. Do lado neozelandês, e pese embora o assumido receio de que uma ajuda pusesse em causa as relações económicas entre Irão e Nova Zelândia, Chris Beeby afirma que visitou com frequência o grupo escondido e arrendou uma casa perto daquela para onde pudessem fugir caso necessário...

Acertos à parte, o filme ilustra bem a dimensão do problema e a forma caricata e surpreendente como ele se solucionou e é, digamos, completo do ponto de vista das variadas emoções a que somos sujeitos. A ver vamos se a Academia concorda e premeia, ainda mais, esta obra de Ben Affleck, que além de realizador brilha também como actor. Quanto ao título acima, para o entender... é ver o filme!

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

O "toma-toma" de Francisco José Viegas


É a notícia do dia: Francisco José Viegas (FJV), Ex-secretário de Estado da Cultura diz que mandará os fiscais da AT "tomar no cú”...

A prosa está no seu blog, num post dirigido a Paulo Núncio, atual secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que veio com a estrambólica ideia de multar quem não pedir fatura.

Como nestas coisas costuma haver sempre uma qualquer declaração da parte do Governo, a réplica coube, imagine-se… a Miguel Relvas (MR)!

Creio que a esmagadora maioria das pessoas concordaria (e concordará) se disser que FJV era do melhor que este Governo tinha… E imagino que essa mesma maioria assinaria uma qualquer missiva a dizer o contrário de MR.

FJV é mais conhecido de todos nós pela literatura, que se dedica com afinco, principalmente a poesia. Aparte as suas qualidades literárias, trata-se de um homem culto, com boas ideias para o país. Só que infelizmente ter boas ideias não é sinónimo de qualquer habilitação para a arena política, nem garante um bom exercício do cargo.

MR é conhecido como o ministro Licenciado-Equivalente... É alvo de chacota e a principal fonte de inspiração aos humoristas nacionais! Todos os dias vamos conhecendo um conjunto de equivalências deste político polivalente. As últimas, imagine-se, estão relacionadas com questões de fé e avançam com a elegibilidade para uma eventual candidatura a sumo pontífice!

Só que o “candidato a candidato” (AKA - MR) ao ministério de Pedro é um soldado ferido em combate e estes, por regra, não ajudam na batalha, antes pelo contrário: atrapalham, são um fardo, provocam incómodo e têm de ser carregados pelos restantes.

Daí a pergunta. Mas porque raio tem de ser MR a responder a FJV!?

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

A Júlio o que é de César

Durante muitos dias não soube como abordar a demissão de Paulo Júlio do cargo de Secretário de Estado para a Reforma Administra e, em alternativa, fui lendo o muito que se escreveu.

Tratando-se de um amigo e de um dos mais inteligentes e competentes políticos da minha safra, creio que o tempo de meditação me permite ter uma opinião mais objectiva sobre aquilo que reputo de uma perda de monta para o Governo e para os portugueses.

Antes do articulado justificativo, atalho eventuais tentações de “malandrices de algibeira” a respeito da minha opinião: entendo que qualquer ilegalidade comprovada e transitada em julgado deve ser punida, que mais não seja, em homenagem ao órgão de soberania que é corporizado nos tribunais.

Dito isto, tal não significa que concorde necessariamente com as leis. Venho, aliás, escrevendo e dizendo que me parece que têm sido feitas demasiadas cedências legislativas no sentido da menorização dos agentes políticos; de tal modo que, hoje em dia, podemos concordar que só aceitará o ónus de o ser quem seja dependente da vida partidária ou pessoas com extrema e genuína dedicação à causa pública, dado o constante escrutínio e até enxovalho e o facto de haver salários bem mais tentadores na iniciativa privada, que não impõe o mesmo grau de devassa, inclusive, da vida privada.

Vem isto entroncar na ideia de que muitas das escolhas para lugares dirigentes – relembro que a demissão de Paulo Júlio teve a ver com o alegado favorecimento de um primo em segundo grau num concurso da Câmara de Penela, a que, à data, presidia – são condicionados por critérios de pretensa objectividade que desprezam em absoluto a confiança política que deve existir entre eleitos e dirigentes que têm por missão concretizar um projecto político sufragado nas urnas. Dir-me-ão que as regras dos concursos visam prevenir abusos… Pois bem, mas a meu ver os abusos, a existirem, devem ser castigados, sendo errado partir de um pressuposto generalizado de desconfiança.

Contudo, o Mundo é como é e não como nós queremos que seja, e acabámos por deitar pela borda fora um talento… Mas que fique clara uma dúvida que paira inevitavelmente no ar: será mera coincidência uma notícia velha de anos vir a lume quando Paulo Júlio “pisou alguns calos” com a anunciada fusão de freguesias? Não branqueando um eventual erro passado, fica o convite à meditação.


Nota: foto "emprestada" aqui.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Traição

Continuo esta série de títulos mono-conceptuais com uma palavra forte que me ocorreu ao assistir ao noticiário de um dos canais informativos portugueses. Falo da necessidade de emigrar sentida por muitos jovens qualificados.

Sei bem que já falei disto por estas páginas e também estou cônscio de que não vale a pena dar proporções bíblicas a algo que, infelizmente e com uma ou duas décadas de excepção, foi sempre a sina de um povo pobre e acabrunhado.

Todavia, creio que o fenómeno cobra a sua novidade na natureza da emigração actual, pois falamos de jovens altamente qualificados e a quem foram criadas expectativas por um sistema de ensino gerido pelo Estado.

Bem sei, igualmente, que a expectativa jurídica já não é o que era. Desconhecendo se é por fraca qualidade de alguma legislação, se pela absoluta prevalência da economia sobre a ética política, se por ambas, o facto é que hoje se põe em causa o que ontem era dado como certo. E nem se veja aqui uma crítica encapotada ao Governo a propósito de salários e afins. As medidas têm sido dolorosas, mas acredito no patriotismo que lhes subjaz, quer de quem legisla, quer de quem (os portugueses) as sofre. Falo, isso sim, a título genérico de outras coisas menores, mas que vão polvilhando alguns diplomas.

Não espanta por isso, e eis a razão do interlúdio, que o “contrato social” (também ele uma legítima expectativa) celebrado há décadas com quem estuda no ensino superior esteja em causa num mundo global em que a lógica da grande finança oblitera qualquer desígnio individual e mesmo, não virá o longe o dia, atinente ao ser humano em si considerado (ou seja, para lá da lógica contabilística). A nova religião é o “Excel”, coisa a que, como também já disse e redisse, mesmo os berços dos ideiais da era contemporânea (os partidos) prestam culto.

Se nunca se pôde pedir que um curso universitário garantisse um emprego e se, há muito, sou dos que diz que o numerus clausus deveria ser estratégico, orientando para cursos com saída, a verdade é que quem tirou ou está a tirar um curso superior (por vezes indo à pós-graduação, mestrado ou mesmo doutoramento) tem toda a legitimidade para esperar uma vida profissional adequada às suas habilitações, obviamente, sem desmerecer quem se quedou, por razões diversas, noutros níveis de ensino.

Contudo, estamos já abaixo disto. Quem tem um curso pode não ter emprego sequer num centro de atendimento telefónico (os chamados call centers), como ouvi um jovem testemunhar na referida peça jornalística… E afunda-se-me a alma e quebra-se-me o ânimo quando vejo outra jovem ponderar um lugar de empregada de balcão na Suiça (sem questionar a dignidade do emprego), onde diz poder ganhar mais do que como psicóloga em Portugal.

Sinto que os políticos – mea culpa com certeza, durante o tempo que o fui – não estiveram à altura dos seus jovens, que hoje se dizem traídos…

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Autoridade

Em vários exemplos da vida e conversas sortidas têm-me feito meditar num valor basilar da vida em comum, que me parece em progressiva delapidação; falo da autoridade…
Creio mesmo que, em Portugal, tal depreciação tem uma explicação adicional àquela que me parece global e que discutiremos infra e que tem a ver com o facto de, no passado recente termos vivido uma revolução inspirada pelos ideais libertários (mas nem sempre libertadores) da extrema-esquerda. Cansados da “estabilidade” (leia-se autoritarismo) do Estado Novo, os portugueses deram, na sua maioria, o beneplácito a uma dinâmica política que via na autoridade um símbolo do tempo a que se não queria voltar. As passagens administrativas no ensino e a perseguição, por exemplo, a professores da Universidade de Coimbra, por muito que lhes dêem outra roupagem eventualmente ideológico, foram, a meu ver, uma vingança contra uma ordem que se odiava acriticamente. Basta, em abono desta visão, ver outros fenómenos como as formas colectivistas de organização surgidas em vários domínios e a própria desresponsabilização individual que, a meu ver, a nossa Constituição encerra, em certos domínios. Começou a época do “proibido proibir”.

Acresce a este um factor global: a influência das novas tecnologias, que, ao mesmo passo que nos ligam a pessoas do outro lado do globo, nos isolam (não é incomum ver pessoas numa mesma mesa sem falarem e olhando ecrãs de telemóveis, com a cara azulada ao jeito de um qualquer Avatar (refiro-me, bem entendido ao filme homónimo). Contudo, ao mesmo tempo que nos isolam, permitem-nos o acesso a mil e um conteúdos (com difícil filtragem, o que é, não raras vezes, berço de idiotices) e, concomitantemente, a uma ideia de poderio individual (empowerment, na ciência política anglo-saxónica). Tudo isto faz com que, mormente, os mais jovens se sintam avalizados para minar a auctoritas do mestre ou do “mais velho”, por acreditarem que o que sabem ou julgam saber é verdade porque viram na televisão ou leram na “Net” (conversa esta que dava um livro, sublinho…).

Se não sou adepto do excesso de autoridade, tampouco o sou da sua míngua… E, desgraçadamente, entendo que, em determinados domínios, resvalamos para este último extremo.

Desde logo na relação com as chamadas forças da ordem. Basta lembrarmos as agressões descaradas a agentes da polícia na tristemente célebre manifestação em frente ao Parlamento para vermos algo que nos pareceria intolerável há vinte anos. É, diga-se, essa mesma fragilização que leva a que um policial não consiga evitar um calvário para justificar uma bastonada, ao passo que raros desordeiros ficam sequer em prisão preventiva.

Depois relembro a já citada relação entre jovens e mais velhos. O chamado “respeito pelos cabelos brancos” é visto como obsoleto, gerando situações de descarte de pessoas idosas a quem se não reconhece o valor de aprendizagem da escola da vida. Na melhor das hipóteses pode esperar-se um insolente “isso é a sua opinião”, numa das piores o afrontamento acintoso.

Por fim, a relação docente-discente que, a mais do vandalismo cada vez mais frequente, ignora, hoje em dia, a ideia essencial de que a transmissão do saber pode ser participada, mas não é um exercício democrático.